sexta-feira, 30 de agosto de 2013

A Batalha do labirinto - capitulo 4




                                 Annabeth quebra as regras

Quíron insistiu que a gente conversasse sobre aquilo de manhã, o que foi tipo: Ei,suas vidas estão em perigo mortal. Durmam bem! Foi difícil cair no sono, mas quando finalmente consegui, sonhei com uma prisão.

Eu vi um garoto em uma túnica grega e sandálias agachado sozinho em uma massiva sala de pedra. O teto era aberto para o céu da noite, mas as paredes tinham mais de seis metros altura e eram de mármore polido, completamente suaves. Espalhados ao redor do quarto havia caixotes de madeira. Alguns estavam quebrados e espalhados, como se tivessem sido jogados lá. Havia ferramentas de bronze espalhadas – um compasso, uma serra e várias outras coisas que eu não consegui reconhecer.

O garoto se encostou ao canto, tremendo de frio, ou medo. Ele fora jogado na lama. Suas pernas, braços e rosto foram arranhados como se ele tivesse sido arrastado com as caixas.

Então a porta dupla de madeira se abriu. Dois guardas vestidos com armaduras de bronze marcharam para dentro, segurando um velho entre eles. Eles jogaram o velho no chão, golpeando uma pilha.

– Pai! – o garoto correu para ele. As roupas do homem estavam em farrapos. Seu cabelo estava raiado de cinza, e sua barba era longa e enrolada. Seu nariz fora quebrado. Seus lábios estavam ensanguentados.

O garoto botou a cabeça do homem em seus braços.

– O que eles fizeram com você?

Então ele berrou para os guardas.

– Eu vou matar vocês!

– Não haverá nenhuma morte hoje – uma voz disse.

Os guardas se moveram para o lado. Atrás deles estava um homem alto com túnica branca. Ele usava um pequeno círculo de ouro em sua cabeça. Sua barba era pontuda como a lâmina de uma lança. Seus olhos brilhavam cruéis.

– Você ajudou o ateniense a matar meu Minotauro, Dédalo. Você virou minha própria filha contra mim.

– Você fez isso, Sua Majestade – sussurrou o homem.

Um guarda deu um chute nas costelas do velho homem. Ele gritou em agonia. O jovem gritou:

– Pare!

– Você ama tanto o seu labirinto – disse o rei, – que eu decidi deixar você aqui. Esta será sua oficina. Faça-me novas maravilhas. Surpreenda-me. Todo labirinto precisa de um monstro. Você será o meu!

– Eu não tenho medo de você – o velho gemeu.

O rei sorriu friamente. Ele botou os olhos no garoto.

– Mas um homem se preocupa com seu filho, hã? Desagrade-me, velho, e na próxima vez que meus guardas infligirem uma punição, será nele!

O rei saiu da sala com seus guardas, e as portas fecharam com uma batida, deixando o pai e o garoto sozinhos na escuridão.

– O que devemos fazer? – o garoto lamentou. – Pai, eles vão te matar!

O velho homem engoliu com dificuldade. Ele tentou sorrir, mas era uma visão horrenda com sua boca sangrando.

– Fique calmo, meu filho. – Ele olhou para as estrelas – E-eu vou achar um jeito.

Uma barra baixou na porta com um fatal BOOM, e eu acordei suando frio.



Eu continuava me sentindo trêmulo de manhã quando Quíron convocou um conselho de guerra. Nós nos encontramos na arena de esgrima, o que eu achei bem estranho – tentar discutir o destino do acampamento enquanto Sra. O’Leary mastigava um iaque rosa de apertar feito de borracha em tamanho natural.

Quíron e Quintus estavam na frente da barraca de armas. Clarisse e Annabeth estavam sentadas ao lado uma da outra e lideravam as instruções. Tyson e Grover estavam sentados longe um do outro o máximo possível. Também estavam presentes em volta da mesa: Juníper, a ninfa da floresta, Silena Beauregard, Travis e Connor Stoll, Beckendorf, Lee Flentcher, até Argos, nosso chefe de segurança com centenas de olhos.

Aquilo foi como eu soube que era sério. Argos dificilmente aparecia, salvo se algo realmente grande estivesse acontecendo. O tempo todo que Annabeth falou, ele manteve seus cem olhos azuis nela tão fixamente que seu corpo todo ficou injetado de sangue.

– Luke deve saber sobre a entrada do Labirinto – disse Annabeth. – Ele sabia tudo sobre o acampamento.

Eu pensei ter ouvido um pouco de orgulho em sua voz, como se ainda respeitasse o cara, mal como ele era.

Juníper limpou sua garganta.

– Isso era o que eu estava tentando dizer a vocês a noite passada. A caverna está há muito tempo lá. Luke costumava usá-la.

Silena Beauregard franziu as sobrancelhas.

– Você sabia sobre a entrada do Labirinto, e não disse nada?

O rosto de Juníper ficou verde.

– Eu não sabia que era importante. Só uma caverna. Eu não gosto de velhas cavernas.

– Ela tem bom gosto – disse Grover.

– Eu não teria prestado nenhuma atenção salvo que... bem, era o Luke. – Ela corou um pouco esverdeando.

Grover bufou.

– Esqueça o que eu disse sobre bom gosto.

– Interessante – Quintus poliu a sua espada enquanto falava. – E você acredita que esse jovem rapaz, Luke, ousaria usar o labirinto como rota de invasão?

– Definitivamente – disse Clarisse. – Se ele pudesse colocar um exército de monstros dentro do Acampamento Meio-Sangue, simplesmente aparecer no meio da floresta sem se preocupar com as nossas fronteiras mágicas, nos não teríamos chance. Ele nos venceria facilmente. Ele deve estar planejado isso há meses.

– Ele esteve mandando exploradores para dentro do labirinto – disse Annabeth. – Nós sabemos porque... porque achamos um.

– Chris Rodriguez – disse Quíron. Ele deu a Quintus um olhar significativo.

– Ah – disse Quintus. – Aquele que está... Sim, eu entendo.

– Aquele que está o quê? – perguntei.

Clarisse olhou fixamente para mim.

– O ponto é que Luke tem procurado por um jeito de navegar no labirinto. Ele tem procurando pela oficina de Dédalo.

Eu me lembrei do sonho da noite passada – o velho homem ensanguentado em roupas esfarrapadas.

– O cara que criou o labirinto.

– Sim – disse Annabeth. – O maior arquiteto, o maior inventor de todos os tempos. Se as lendas estiverem certas, sua oficina está no centro do labirinto. Ele é o único que sabia como navegar no labirinto perfeitamente. Se Luke conseguir encontrar a oficina e convencer Dédalo a ajudá-lo, Luke não se atrapalharia procurando por caminhos, ou arriscaria a perder seu exército nas armadilhas do Labirinto. Ele poderia navegar para onde quisesse – rapidamente e com segurança. Primeiro para o acampamento para se livrar de nós. Depois... para o Olimpo.

A arena ficou quieta exceto pelo iaque de brinquedo da Sra. O’Leary que fazia SQUEAK! SQUEAK!

Finalmente Beckendorf colocou suas enormes mãos em cima da mesa.

– Um minuto, Annabeth, você disse ‘convencer Dédalo’? Dédalo não está morto?

Quintus grunhiu.

– Eu esperaria que sim. Ele viveu, o quê, três mil anos atrás? E mesmo que ele estivesse vivo, as antigas histórias não dizem que ele fugiu do Labirinto?

Quíron mexeu seus cascos inquietamente.

– Esse é o problema, meu querido Quintus. Ninguém sabe. Há rumores... bem, há vários rumores perturbadores sobre Dédalo, mas um é que ele desapareceu dentro do labirinto no fim da sua vida. Ele pode ainda estar lá.

Eu pensei no velho homem que vira no meu sonho. Ele parecera tão frágil que era difícil acreditar que ele havia durado mais uma semana, muito menos três mil anos.

– Nós precisamos entrar – anunciou Annabeth. – Nós precisamos encontrar a oficina antes de Luke. Se Dédalo está vivo, nós o convenceremos a nos ajudar, não Luke. Se o fio de Ariadne ainda existe, temos que ter certeza que nunca irá cair nas mãos de Luke.

– Espere um momento – eu disse. – Se nós estamos preocupados com um ataque, por que nós não simplesmente explodimos a entrada? Selamos o túnel?

– Excelente ideia! – falou Grover. – Eu vou pegar a dinamite!

– Não é tão fácil, idiota – disse Clarisse. – Nós tentamos isso na entrada que achamos em Phoenix. Não correu bem.

Annabeth assentiu.

– O labirinto é arquitetura mágica, Percy. Precisaria de um poder enorme para selar mesmo uma das entradas. Em Phoenix, Clarisse pôs a baixo um prédio inteiro com uma bola de demolição, e a entrada do labirinto só se deslocou alguns metros. O melhor que podemos fazer é evitar que Luke aprenda a navegar no labirinto.

– Nós poderíamos lutar – disse Lee Fletcher. – Nós agora sabemos onde é a entrada. Nós podemos formar uma linha defensiva e esperar por eles. Se um exército tentar invadir, vão nos encontrar esperando com nossos arcos.

– Nós certamente faremos uma defesa – disse Quíron. – Mas temo que Clarisse tenha razão. As fronteiras mágicas têm mantido o acampamento seguro por centenas de anos. Se Luke conseguir trazer um largo exército para dentro do acampamento, contornando nossas barreiras... nós talvez não tenhamos a força para derrotá-los.

Ninguém parecia realmente feliz com essas notícias. Quíron normalmente tenta ser otimista. Se ele estava predizendo que não teríamos força para aguentar um ataque, isso não era bom.

– Nós temos que chegar à oficina de Dédalo primeiro – insistiu Annabeth. – Achar o fio de Ariadne e impedir Luke de usá-lo.

– Mas se ninguém consegue navegar lá – disse, – que chances nós temos?

– Eu estive estudando arquitetura por anos – disse ela. – Eu conheço o Labirinto de Dédalo melhor que ninguém.

– Lendo sobre isso.

– Bem, sim.

– Não é o suficiente.

– Tem que ser!

– Não é!

– Você vai me ajudar ou não?

Eu percebi que todos observavam a mim e a Annabeth como se fosse uma partida de tênis. O brinquedo de apertar da Sra. O’Leary fez EEK! quando ela arrancou a cabeça rosa de borracha dele.

Quíron limpou a garganta.

– Prioridades primeiro. Nós precisamos de uma missão. Alguém precisa entrar no labirinto, achar a oficina de Dédalo, e impedir Luke de usar o labirinto para invadir o acampamento.

– Nós todos sabemos quem deve liderar isso – disse Clarisse. – Annabeth.

Houve um murmúrio de concordância. Eu sabia que Annabeth estivera esperando sua própria missão desde que era uma menina, mas ela parecia desconfortável.

– Você fez tanto quanto eu, Clarisse – ela disse. – Você deveria ir também.

Clarisse balançou sua cabeça.

– Eu não vou voltar lá!

Travis Stoll riu.

– Não me diga que você está com medo. Clarisse, amarelando?

Clarisse se levantou, eu achei que ela iria pulverizar Travis, mas ela disse em uma voz trêmula:

– Você não entende nada, moleque. Eu nunca mais vou voltar lá. Nunca!

Ela saiu tempestivamente da arena.

Travis olhou ao redor estupefato.

– Eu não tive a intenção...

Quíron ergueu sua mão.

– A pobre garota teve um ano difícil. Agora, todos concordam que Annabeth deve liderar a busca?

Todos assentiram, menos Quintus. Ele cruzou seus braços e encarou a mesa, mas eu não estava certo se alguém mais reparou.

– Muito bem – Quíron se dirigiu a Annabeth. – Minha querida, é sua vez de visitar o Oráculo. Assumindo que você retorne inteira, iremos discutir o que fazer a seguir.



Esperar Annabeth foi mais difícil do que eu próprio visitar o Oráculo. Eu já o escutara dizer profecias duas vezes antes. A primeira vez foi no empoeirado porão da Casa

Grande, onde o espírito de Delfos dormia dentro do corpo de uma moça hippie mumificada. Na segunda vez o Oráculo saiu para um pequeno passeio no bosque. Eu ainda tenho pesadelos sobre isso.

Eu nunca me senti amedrontado pela presença do Oráculo, mas eu ouvira as histórias: campistas que enlouqueceram, ou que tiveram visões tão reais que morreram de medo. Eu andei pela arena, esperando. Sra. O’Leary comeu seu lanche, que consistia em cinquenta quilos de carne moída e vários biscoitos caninos do tamanho de tampas de lata de lixo. Eu me perguntei onde Quintus arranjava biscoitos caninos desse tamanho. Eu não achava que você podia apenas entrar na seção de bichos de estimação e simplesmente colocar isso no seu carrinho de compra.

Quíron se aprofundara em uma conversa com Argos e Quintus. Parecia para mim que eles estavam discordando sobre alguma coisa. Quintus ficava sacudindo sua cabeça.

No outro lado da arena, Tyson e os irmãos Stoll estavam apostando corrida com carruagens de bronze miniaturas que Tyson fizera de restos de armaduras. Eu desisti de andar e sai da arena. Olhei através dos campos para a janela do sótão da Casa Grande, escura e quieta. Por que Annabeth estava demorando tanto? Eu estava certo que não levara tanto tempo para pegar minha missão.

– Percy – uma garota sussurrou.

Juníper estava nos arbustos. Era estranho como ela quase ficava invisível quando ela estava cercada por plantas. Ela sinalizou para mim urgentemente.

– Você precisa saber: Luke não foi o único que eu vi perto da caverna.

– O que você quer dizer?

Ela olhou para a arena.

– Eu estava tentando dizer algo, mas ele estava lá.

– Quem?

– O professor de esgrima – ela disse. – Ele estava andando ao redor das pedras.

Meu estômago embrulhou.

– Quintus? Quando?

– Eu não sei: eu não presto atenção em datas. Uma semana atrás talvez, quando ele apareceu pela primeira vez.

– O que ele estava fazendo? Ele entrou lá?

– E-eu não tenho certeza. Ele é assustador, Percy. Eu nem sequer o vi entrar na clareira. De repente ele estava ali. Você tem que dizer ao Grover que isso é muito perigoso–

– Juníper? – Grover chamou de dentro da arena. – Aonde você foi?

Juníper suspirou.

– É melhor eu ir. Apenas se lembre do que eu disse. Não confie naquele homem!

Ela correu para a arena.

Eu olhei para a Grande casa, sentindo-me mais desconfortável do que nunca. Se Quintus estava tramando algo... Eu precisava do conselho de Annabeth. Ela saberia o que fazer com as notícias de Juníper. Mas onde raios ela estava? Seja o que for que estivesse acontecendo no Oráculo, não deveria demorar tanto.

Finalmente não pude aguentar mais.

Era contra as regras, mas, novamente, ninguém estava vendo. Corri colina abaixo e cruzei os campos.



A sala da frente da Casa Grande estava estranhamente quieta. Eu estava acostumado a ver Dioniso em frente à lareira, jogando cartas e comendo uvas e amolando sátiros, mas o Sr. D ainda estava fora.

Eu caminhei pelo corredor, tábuas rangiam debaixo dos meus pés. Quando cheguei à base da escada, eu hesitei. Quatro andares acima haveria um pequeno alçapão que levava ao sótão. Annabeth estaria em algum lugar lá em cima. Eu fiquei em silêncio e atento. Mas o que ouvi não foi o que eu esperava. Soluços. E estava vindo de algum lugar abaixo de mim.

Eu rastejei em torno da escada. A porta do porão estava aberta. Eu nem sabia que a Casa Grande tinha um porão. Eu espiei para dentro e vi duas figuras no canto mais afastado, sentados no meio de estoques de ambrosia e morango em conserva. Uma era Clarisse. A outra era um adolescente hispânico em calças camufladas esfarrapadas e com uma blusa preta suja. Seu cabelo estava gorduroso e opaco. Ele estava abraçando seus ombros e soluçando. Era Chris Rodrigues, o meio-sangue que fora trabalhar para Luke.

– Está tudo bem – Clarisse estava dizendo para ele. – Tente um pouco mais de néctar.

– Você é uma ilusão, Mary! – Chris se encolheu mais no canto, – V-vá embora.

– Meu nome não é Mary. – A voz de Clarisse era gentil, mas muito triste. Eu nunca pensei que Clarisse pudesse falar desse jeito. – Meu nome é Clarisse. Lembre-se. Por favor!

– Está escuro! – gritou Chris. – Tão escuro!

– Venha para fora – Clarisse sussurrou. – A luz do sol irá te ajudar.

– Mil... mil caveiras. A terra continua curando-o.

– Chris – Clarisse pediu. Parecia que ela estava prestes a chorar. – Você tem que melhorar. Por favor. Sr. D vai voltar logo. Ele é especialista em loucura. Só aguente firme.

Os olhos de Chris pareciam os de um rato encurralado – selvagem e desesperado.

– Não há saída, Mary. Não há saída.

Então ele apanhou um vislumbre de mim e fez um som apavorante, estrangulado.

– O filho de Poseidon! Ele é horrível!

Eu recuei, esperando que Clarisse não tivesse me visto. Eu esperei que ela me atacasse e gritasse comigo, mas ela apenas continuou falando com Chris em uma voz triste, pedinte, tentando fazê-lo beber mais néctar. Talvez ela tenha pensado que fazia parte da ilusão de Chris, mas... Filho de Poseidon? Chris estivera olhando para mim, mas ainda assim porque eu tive a sensação que ele não falara sobre mim?

E a ternura da Clarisse – nunca me ocorreu que ela poderia gostar de alguém; mas a forma que ela disse o nome de Chris... Ela o conhecera antes dele mudar de lado. Ela o conhecia muito melhor do que eu percebia. E agora ele estava tremendo em um canto do porão, com medo de sair, e balbuciando sobre alguém chamada Mary. Não era surpreendente que Clarisse não quisesse nada com o Labirinto. O que acontecera com Chris lá dentro?

Eu ouvi um rangido em cima – como a porta do sótão abrindo – e corri para a porta da frente. Eu precisava sair daquela casa.



– Minha querida – disse Quíron. – Você conseguiu.

Annabeth olhou para mim primeiro. Eu não podia dizer se ela estava tentando me alertar, ou se o olhar nos olhos dela era puro medo. Então ela focou em Quintus.

– Eu ouvi a profecia. Eu vou liderar a busca para achar a oficina de Dédalo.

Ninguém comemorou. Quero dizer, nós todos gostávamos de Annabeth, e queríamos que ela tivesse uma missão, mas essa era insanamente perigosa. Depois do que eu vira de Chris Rodriguez, eu nem queria pensar sobre Annabeth descendo para aquele estranho labirinto de novo.

Quíron raspou um casco no chão sujo.

– O que dizia exatamente a profecia, minha querida? As palavras são importantes.

Annabeth respirou fundo.

– Eu, ah... bem, dizia, Descerás na escuridão do labirinto infinito...

Nós esperamos.

– ... o morto, o traidor, e o perdido reerguidos.

Grover se exaltou.

– O desaparecido! Tem que ser Pã! Isso é ótimo!

– Com o morto e o traidor – eu adicionei. – Não tão ótimo.

– E? – Quíron perguntou. – Qual é o resto?

– Ascenderás ou cairás pelas mãos do rei espectral – recitou Annabeth, – da criança de Atena, a defesa final.

Todos se olharam desconfortáveis. Annabeth era filha de Atena, e ato final não soava muito bem.

– Ei... não devemos tirar conclusões precipitadas – disse Silena. – Annabeth não é a única criança de Atena, certo?

– Mas quem é esse rei fantasma? – Beckendorf perguntou.

Ninguém respondeu. Eu pensei na mensagem de Íris em que eu vira Nico invocando espíritos. Tive um mau pressentimento que a profecia estava conectada com isso.

– Há mais linhas? – Quíron perguntou. – A profecia não parece completa.

Annabeth hesitou.

– Eu não me lembro exatamente.

Quíron ergueu uma sobrancelha. Annabeth era conhecida por sua memória. Ela nunca esquecia coisas que ela tinha ouvido.

Annabeth se mexeu no seu banco.

– Alguma coisa sobre... O último suspiro do herói acontecer.

– E..? – Quíron perguntou.

Ela continuou parada.

– Olha, o ponto é que eu tenho que entrar. Eu vou achar a oficina e impedir Luke. E... eu preciso de ajuda. – Ela se virou para mim. – Você virá?

Eu sequer hesitei.

– Estou dentro.

Ela sorriu para mim pela primeira vez em dias, e isso fez tudo valer a pena.

– Grover, você também? O deus da natureza está esperando.”

Grover pareceu esquecer o quanto ele odiava o subsolo. A linha sobre “o desaparecido” havia energizado-o completamente.

– Eu vou empacotar recicláveis extras para o lanche!

– E Tyson – disse Annabeth. – Vou precisar de você também.

– Oba! Hora de explodir coisas! – Tyson bateu palmas com tanta força que acordou a Sra. O’Leary que estava cochilando no canto.

– Espere, Annabeth – disse Quíron. – Isto vai contra as leis antigas. A um herói é permitido apenas dois companheiros.

– Eu preciso de todos eles – ela insistiu. – Quíron, isso é importante.

Eu não sabia por que ela tinha tanta certeza, mas eu estava feliz por ela ter incluído Tyson. Eu não podia me imaginar deixando ele para trás. Ele era grande e forte e ótimo entendendo coisas mecânicas. Diferente dos sátiros, os ciclopes não tinham problema no subsolo.

– Annabeth – Quíron mexeu sua cauda nervosamente. – Considere bem. Você estaria quebrando as leis antigas, e sempre existem consequências. No último inverno, cinco foram numa missão para salvar Ártemis. Apenas três voltaram. Pense nisso. Três é um número sagrado. Há três parcas, três fúrias, três filhos olimpianos de Cronos. É um bom número forte que se sustenta contra muitos perigos. Quatro... é um risco.

Annabeth respirou fundo.

– Eu sei. Mas nós precisamos. Por favor.

Eu podia dizer que Quíron não gostou disso. Quintus estava nos observando, como se estivesse tentando decidir qual de nós voltaria vivo.

Quíron suspirou.

– Muito bem. Vamos parar por aqui. Os membros da missão devem se preparar. Amanhã ao amanhecer, enviaremos vocês para o Labirinto.



Quintus me puxou de lado quando o conselho se dissolveu.

– Eu tenho um mau pressentimento sobre isso – ele me disse.

Sra. O’Leary veio para perto de nós, abanando sua cauda feliz. Ela jogou seu escudo aos meus pés, e eu o joguei para ela. Quintus assistiu ela correr atrás dele. Eu me lembrei do que Juníper dissera sobre ele ter ido explorar o Labirinto. Eu não confiava nele, mas quando ele olhou para mim, eu vi preocupação real em seus olhos.

– Eu não gosto da ideia de você ir lá embaixo – disse ele. – Nenhum de vocês. Mas se vocês precisam, eu quero que você se lembre de algo. O labirinto existe para confundir você. Ele vai distraí-lo. É perigoso para meio-sangues. Nós somos facilmente distraídos.

– Você já esteve lá?

– Há muito tempo. – Sua voz falhou. – Eu quase não escapei com a minha vida. A maioria que entra não tem essa sorte.

Ele segurou meu ombro.

– Percy, mantenha sua mente focada no que mais importa. Se você conseguir fazer isso, você encontrará o caminho. E aqui, queria te dar isso.

Ele me entregou um pequeno tubo prata. Era tão frio que eu quase o larguei.

– Um apito? – perguntei.

– Um apito de cachorro – disse Quintus. – Para a Sra. O’Leary.

– Hum, obrigado, mas–

– Como isso irá funcionar no labirinto? Eu não tenho cem por cento de certeza que irá. Mas a Sra. O’Leary é um cão infernal. Ela pode aparecer quando chamada, não importa quão longe ela esteja. Eu me sentiria melhor se você ficasse com isso. Se você realmente precisar de ajudar, use isso; mas seja cuidadoso, o apito é feito de gelo estígio.

– Gelo o quê?

– Do rio Estige. Muito difícil de fazer. Muito delicado. Ele não pode derreter, mas ele vai se despedaçar quando você assoprá-lo, então você só pode usá-lo uma vez.

Eu pensei em Luke, meu antigo inimigo. Antes de ir na minha primeira missão, Luke me deu um presente também – tênis mágicos que foram programados para me arrastar para a minha morte. Quintus parecia legal. Tão preocupado. E a Sra. O’Leary gostava dele, o que devia contar para alguma coisa. Ela largou o escudo pegajoso aos meus pés e latiu excitadamente.

Eu me senti envergonhado por ter sequer pensado em desconfiar de Quintus. Mas novamente, eu confiei em Luke uma vez.

– Obrigado – disse a Quintus. Coloquei o apito congelante no meu bolso, prometendo a mim mesmo que eu nunca o usaria, então corri para encontrar Annabeth.



Desde que entrara para o acampamento, eu nunca estivera dentro do chalé de Atena. Era um prédio prata, nada extravagante, com planas cortinas brancas e uma coruja entalhada em pedra sobre a porta. Os olhos de ônix da coruja pareciam me seguir enquanto eu me aproximava.

– Oi? – chamei.

Ninguém respondeu. Eu entrei e respirei fundo. O lugar era uma oficina para crianças superdotadas. Os beliches estavam todos empurrados ao lado de uma parede como se dormir não fosse importante. A maior parte da sala estava cheia de bancadas e mesas e conjuntos de ferramentas e armas. No fundo da sala estava uma enorme biblioteca cheia de antigos pergaminhos, livros com capas de couro e brochuras. Havia uma mesa de desenho de arquiteto com um monte de réguas e transferidores, e alguns modelos 3-D de prédios. Enormes velhos mapas de guerra estavam afixados no teto. Conjuntos de armaduras estavam pendurados abaixo da janela, seus pratos de bronze brilhando no sol.

Annabeth estava na parte de trás do cômodo, remexendo através de pergaminhos velhos.

– Toc, toc? – falei.

Ela virou com um arranque.

– Oh,... oi. Não escutei você.

– Você está bem?

Ela fechou a cara para os pergaminhos em suas mãos.

– Só tentando fazer uma pesquisa. O Labirinto de Dédalo é tão grande. Nenhuma das histórias concorda em alguma coisa. Os mapas apenas levam do nada a lugar nenhum.

Eu pensei no que Quintus dissera, como o labirinto tenta distrair você. Eu me perguntei se Annabeth já sabia disso.

– Nós vamos descobrir – prometi.

Seu cabelo havia se soltado e estava suspenso em uma cortina emaranhada loira em volta do seu rosto. Seus olhos cinzentos pareciam quase pretos.

– Eu quis liderar uma missão desde que tinha sete anos – disse ela.

– Você vai ser incrível.

Ela olhou para mim agradecida, mas então olhou para baixo para todos os livros e pergaminhos que ela tirara das prateleiras.

– Eu estou preocupada, Percy. Talvez eu não devesse ter te chamado para fazer isso. Ou Tyson ou Grover.

– Ei, nós somos seus amigos. Nos não perderíamos isso.

– Mas... – Ela se interrompeu.

– O que é? – perguntei – A profecia?

– Tenho certeza que está tudo bem – ela disse em voz baixa

– Qual era a última linha?

Então ela fez algo que realmente me surpreendeu. Ela piscou lágrimas e esticou os braços.

Eu dei um passo a frente e a abracei. Borboletas começaram a se revirar no meu estômago.

– Ei, está... está tudo bem. – Eu afaguei suas costas.

Eu estava ciente de tudo no cômodo. Eu sentia como se pudesse ler a menor impressão em qualquer livro das prateleiras. O cabelo de Annabeth cheirava a sabonete de limão. Ela estava tremendo.

– Talvez Quíron esteja certo – sussurrou ela. – Eu estou quebrando as regras. Mas eu não sei mais o que fazer. Eu preciso de vocês três. Apenas parece certo.

– Então não se preocupe com isso – falei. – Nós já tivemos muitos problemas antes, e nós resolvemos todos.

– Isto é diferente. Eu não quero que nada aconteça com... nenhum de vocês.

Atrás de mim, alguém pigarreou.

Era um dos meio-irmãos de Annabeth, Malcom. O rosto dele estava vermelho brilhante.

– Hum, desculpa – disse ele. – O treino de arco e flecha já começou, Annabeth. Quíron disse para vir achar você.

Eu me afastei de Annabeth.

– Nós só estávamos olhando mapas – eu disse estupidamente.

Malcom olhou para mim.

– Ok.

– Diga a Quíron que eu já vou estar lá – disse Annabeth, e Malcom saiu apressado. Annabeth esfregou os olhos. – Vá em frente, Percy. É melhor eu me preparar para o

treino de arco e flecha.

Eu assenti, sentindo-me mais confuso do que jamais me sentira na minha vida. Eu queria sair correndo do chalé... mas de novo eu não o fiz.

– Annabeth? – disse. – Sobre sua profecia. A frase sobre o último suspiro de um herói...

– Você está imaginando qual herói? Eu não sei.

– Não. É outra coisa. Eu estive pensando que a última frase normalmente rima com a anterior. Era alguma coisa sobre – terminava com palavra morrer?

Annabeth olhou para os seus pergaminhos.

– Seria melhor você ir, Percy. Prepare-se para a missão. Eu verei - verei você de manhã.

Eu a deixei lá, vendo os mapas que levavam do nada para lugar nenhum; mas eu não podia afastar a sensação de que um de nós não voltaria dessa missão vivo.

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