sábado, 31 de agosto de 2013

O ultimo olimpiano - capitulo 14




                                                Porcos voam

De volta ao Plaza, Thalia me puxou de lado.

– O quê Prometeu te mostrou?

Relutante, eu contei a ela sobre a visão na casa de May Castellan. Thalia coçou sua perna como se estivesse lembrando-se dessa velha ferida.

– Foi uma noite ruim – ela admitiu. – Annabeth era tão pequena, eu não acho que ela realmente entendeu o que viu. Ela sabia apenas que Luke estava triste.

Eu olhei o Central Park pela janela. Alguns pequenos incêndios ocorriam no norte, mas mesmo assim a cidade parecia estranhamente pacífica.

– Você sabe o que aconteceu com a May Castellan? Quero dizer...

– Eu sei o que você quer dizer – Thalia disse. – Eu nunca a vi ter uma, hã, crise, mas Luke me contou sobre os olhos brilhantes, as coisas estranhas que ela falava. Ele me fez prometer nunca contar. O que causou, eu não faço ideia. Se Luke sabia, ele nunca me disse.

– Hermes sabia – eu disse. – Algo fez May ver partes do futuro de Luke, e Hermes entendeu o que aconteceria - como ele se transformaria em Cronos”

Thalia franziu a sobrancelha.

– Você não pode ter certeza disso. Lembre-se de que Prometeu estava manipulando o que você via, Percy, mostrando o lado negativo. Hermes amava Luke. Eu diria apenas de olhar para o rosto dele. E Hermes estava lá olhando May, cuidando dela. Ele não era inteiramente mau.

– Ainda não está certo – eu insisti. – Luke era apenas uma criança. Hermes nunca o ajudou, nunca o impediu de fugir.

Thalia pôs seu arco no ombro. Novamente fiquei espantado com o fato de ela não envelhecer mais. Você poderia quase ver um brilho prateado em volta dela – a bênção de Ártemis.

– Percy – ela disse. – Você não pode começar a sentir pena de Luke. Todos nós temos coisas duras com que lidar. Todos os semideuses têm. Nossos pais raramente estão por perto. Mas Luke fez escolhas ruins. Ninguém o forçou a fazer aquilo, na verdade...

Ela olhou pela sala para ter certeza de que estávamos sozinhos.

– Eu estou preocupada com Annabeth. Se ela tiver que enfrentar Luke na batalha, eu não sei se conseguirá. Ela sempre teve uma quedinha por ele.

Eu corei.

– Ela vai ficar bem.

– Eu não sei. Depois daquela noite, depois que deixamos a casa da mãe dele, sabe? Luke nunca mais foi o mesmo. Ele ficou imprudente e carrancudo, como se tivesse que provar algo. Quando Grover nos encontrou e tentou nos levar ao Acampamento... bom, uma parte do motivo de termos nos metido em tantas encrencas é porque Luke não se cuidava. Annabeth não via aquilo como um problema. Luke era seu herói. Ela apenas entendeu que seus pais o deixaram triste e passou a defende-lo. Ela ainda o defende. Tudo que estou dizendo... não caia na mesma armadilha. Luke se entregou a Cronos agora. Nós não podemos pegar leve com ele.

Eu olhei os incêndios no Harlem, e me perguntei quantos mortais que dormiam estariam em perigo por causa das más escolhas de Luke.

– Você está certa – eu disse.

Thalia bateu de leve no meu ombro.

– Eu vou olhar as Caçadoras e descansar antes do pôr do sol. Você deveria tentar também.

– A última coisa que eu preciso é de mais sonhos.

– Eu sei, acredite em mim. – Sua expressão sombria me fez imaginar com o que ela estaria sonhando. Era um problema comum entre os semideuses: quanto mais perigosa ficava a situação, piores os sonhos ficavam. – Mas Percy, não sabemos quando teremos outra chance de descansar. Será uma noite longa - talvez nossa última noite.

Eu não gostei, mas sabia que ela estava certa. Eu assenti cansado e entreguei o vaso de Pandora a ela.

– Me faça um favor. Tranque isso no cofre do hotel, ok? Eu acho que sou alérgico a pithos.

Thalia sorriu.

– Você quem manda.

Eu encontrei a cama mais próxima e desmaiei. Mas é claro, o sono só trouxe mais pesadelos.



Eu vi o palácio submarino do meu pai. O exército inimigo estava mais perto agora, entrincheirado apenas algumas centenas de jardas do lado de fora do palácio. As fortalezas tinham sido completamente destruídas. O templo que meu pai tinha usado como quartel general queimava em fogo grego.

Eu olhei para a sala de armas, onde meu irmão e outros Ciclopes estavam na pausa para o almoço, comendo enormes jarras de cookies com manteiga de amendoim (e não me pergunte qual o gosto delas embaixo d’água, pois eu não queria saber). Conforme eu olhava, a parede exterior explodiu. Um guerreiro ciclope cambaleou para dentro, tendo colapsos na mesa do almoço. Tyson se ajoelhou para ajudar, mas era muito tarde. O ciclope se dissolveu em areia do mar.

Gigantes inimigos tentaram entrar pela fenda aberta, e Tyson pegou o porrete do ciclope caído. Ele gritou algo para seus companheiros – provavelmente “Por Poseidon!” – mas com sua boca cheia de manteiga de amendoim ficou como “HÃ EDMDOM!” Seus companheiros pegaram martelos e formões, gritaram “MANTEIGA DE AMENDOIM!” e seguiram Tyson, correndo para a batalha.

Então a cena mudou. Eu estava com Ethan Nakamura no campo inimigo. O que eu vi me deu arrepios, em parte porque o exército era imenso, em parte porque eu conhecia o lugar.

Estávamos na região rural Nova Jersey, numa estrada desintegrada, cheia de empresas velhas e outdoors esfarrapados. Uma cerca pisoteada cercava um grande jardim repleto de estátuas de cimento. O outdoor no armazém estava difícil de ler, pois estava em vermelho cursivo, mas eu sabia o que estava escrito: EMPÓRIO DE ANÕES DE JARDIM DA TIA EME.

Eu não pensava naquele lugar havia anos. Estava claramente abandonado. As estátuas estavam quebradas e pichadas de preto. Um sátiro de cimento – Ferdinando, o tio de Grover – tinha perdido o braço. Parte do telhado tinha cavidades. Um grande aviso em amarelo na porta dizia: CONDENADO.

Centenas de barracas e fogueiras forravam a propriedade. Na maioria monstros, mas havia mercenários humanos e alguns semideuses também. Uma bandeira preta e roxa estava hasteada fora do empório, guardada por dois hiperbóreos.

Ethan estava agachado perto da primeira fogueira. Outros semideuses sentavam com ele, amolando suas espadas. A porta do armazém se abriu, e Prometeu saiu.

– Nakamura – ele chamou. – O mestre gostaria de falar com você.

Ethan levantou cautelosamente.

– Algo de errado?

Prometeu sorriu.

– Você terá que perguntar a ele.

Um dos outros semideuses abafou um riso.

– Foi bom ter conhecido você.

Ethan arrumou sua bainha e entrou no armazém.

Com exceção do buraco no telhado, o lugar estava exatamente como eu lembrava. Estátuas de pessoas aterrorizadas estavam congeladas no centro. Na lanchonete, as mesas de piquenique haviam sido arrastadas de lado. Entre a máquina de refrigerante e o aquecedor de pretzels havia um trono dourado. Cronos estava lá, com sua foice no colo. Ele usava jeans e uma camiseta, e com sua expressão ele parecia quase humano – como a versão mais jovem de Luke que eu vi na visão, pedindo a Hermes para contar seu destino. Então Luke viu Ethan, e seu rosto formou um sorriso bem inumano. Seus olhos dourados brilharam.

– Bem, Nakamura. O que você achou da missão diplomática?

Ethan hesitou.

– Eu estou certo de que o Senhr Prometeu é mais apto a falar...

– Mas eu perguntei a você.

O olho bom de Ethan disparou para frente e para trás, notando os guardas que rodeavam Cronos.

– Eu... eu não acho que Jackson se renderá. Jamais.

Cronos assentiu.

– Algo mais que você queira me dizer?

– N-não, senhor.

– Você parece nervoso, Ethan.

– Não, senhor. É só que... eu ouvi falar que este era o covil da...

– Medusa? Sim, pura verdade. Lugar adorável, não é? Infelizmente, Medusa não se reformou desde que Jackson a matou, então não se preocupe em se juntar à coleção dela. Além disso, há forças muito mais perigosas nesta sala.

Cronos olhou para um gigante lestrigão que mastigava ruidosamente algumas batatas fritas. Cronos acenou com a mão e o gigante congelou. Uma batata frita permanecia suspensa a meio caminho de sua boca.

– Por que transformá-los em pedra – Cronos disse – quando se pode parar o próprio tempo?

Seus olhos dourados fitaram o rosto de Ethan.

– Agora, me conte outra coisa. O que aconteceu ontem à noite na ponte Williamsburg?

Ethan tremeu. Gotas de suor brotavam em sua testa.

– Eu... eu não sei, senhor.

– Sim, você sabe – Cronos levantou de seu trono. – Quando você atacou Jackson, algo aconteceu. Algo não estava certo. A garota, Annabeth, pulou em sua frente.

– Ela queria salvá-lo.

– Mas ele é invulnerável – Cronos disse baixinho. – Você mesmo viu.

– Eu não posso explicar. Talvez ela tenha esquecido.

– Ela se esqueceu – Cronos disse. – É, deve ser isto. Oh, querido. Eu esqueci que meu amigo é invulnerável e levei uma facada por ele. Oops. Diga-me, Ethan, onde você estava mirando quando o atacou?

Ethan franziu a sobrancelha. Ele fechou o punho como se estivesse segurando uma lâmina, e fingiu uma estocada.

– Eu não tenho certeza, senhor. Tudo ocorreu muito rápido. Eu não estava mirando um lugar específico.

Cronos tamborilou sua foice com os dedos.

– Sei – disse ele em tom gélido. – Se sua memória melhorar, eu vou querer...

De repente o Senhor dos Titãs estremeceu. O gigante na ponta da sala descongelou e a batata frita caiu em sua boca. Cronos recuou e sentou de novo em seu trono.

– Meu senhor? – Ethan arriscou.

– Eu – a voz era fraca, mas apenas por um momento era a de Luke. Então sua expressão endureceu. Ele esticou as mãos e flexionou os dedos vagarosamente, como se estivesse forçando-os a obedecê-lo.

– Não é nada – disse ele, sua voz inflexível e fria novamente. – Um pequeno desconforto.

Ethan umedeceu os lábios.

– Ele ainda está lutando contra o senhor, não é? Luke...

– Tolice – Cronos cuspiu. – Repita essa mentira, e eu corto sua língua fora. A alma do garoto foi quebrada. Estou apenas me acostumando aos imites desta forma. É necessário descansar. É chato, mas nada além de um inconveniente temporário.

– Como... como quiser, meu senhor.

– Você! – Cronos apontou sua foice a uma dracaenae com armadura e uma coroa verde. – Rainha Sess, não?

– Ssssssim, meu lorde.

– A nossa surpresinha está pronta para ser liberada?

A dracaenae mostrou as presas.

– Oh, ssssssim, meu lorde. É uma linda sssssurpresssa.

– Excelente – Cronos disse. – Diga ao meu irmão Hyperíon para mover nossas forças ao sul até o Central Park. Os meio-sangues ficarão tão confusos que não saberão como se defender. Vá agora, Ethan. Trabalhe sua memória. Conversaremos de novo quando tivermos tomado Manhattan.

Ethan se curvou, e meus sonhos mudaram uma última vez. Eu vi a Casa Grande do acampamento, mas era numa época diferente. A casa era vermelha, e não azul. Os campistas na quadra de vôlei tinham cabelos do início dos anos 90, o que deveria servir para manter os monstros longe.

Quíron estava no portão, conversando com Hermes e uma mulher com um bebê no colo. O cabelo de Quíron era mais curto e mais escuro. Hermes usava sua roupa de corrida habitual e seu tênis alado. A mulher era alta e bonita. Ela era loira, olhos brilhantes e um sorriso amigável. O bebê em seus braços contorcia-se como se a última coisa que quisesse era estar no Acampamento Meio-Sangue.

– É uma honra tê-la aqui – Quíron disse para a mulher, mas ele parecia nervoso. – Faz muito tempo que não permitem a entrada de uma mortal no Acampamento.

– Não a encoraje – Hermes resmungou. – May, você não pode fazer isto.

Ela não se parecia nem um pouco com a velha que eu conheci. Ela parecia cheia de vida – o tipo de pessoa que poderia sorrir e fazer todos a sua volta se sentirem bem.

– Oh, não se preocupe tanto – May disse, balançando o bebê. – Você precisa de um Oráculo, não precisa? O último está morto há, digamos, vinte anos?

– Mais – Quíron disse gravemente.

Hermes esticou os braços, exasperado.

– Eu não te contei essa história para que você pudesse se candidatar. É perigoso. Quíron, diga a ela.

– É – Quíron avisou. – Por muitos anos eu proibi qualquer um de tentar. Nós não sabemos exatamente o que aconteceu. Os humanos vêm perdendo a capacidade de hospedar o Oráculo.

– Nós já passamos por isso – May disse. – E eu sei que posso fazer isso. Hermes, esta é a minha chance de fazer algo bom. Eu recebi o dom da visão por algum motivo.

Eu queria gritar para May Castellan parar. Eu sabia o que estava para acontecer. Eu finalmente percebi porque sua vida tinha sido destruída. Mas eu não podia falar ou me mexer.

Hermes parecia mais machucado do que preocupado.

– Você não poderia se casar se você se tornasse o Oráculo – ele reclamou. – Você não poderia me ver mais.

May pôs sua mão no braço dele.

– Não posso tê-lo para sempre, posso? Logo você seguirá adiante. Você é imortal.

Ele começou a protestar, mas ela pôs sua mão em seu peito.

– Você sabe que é verdade! Não tente poupar meus sentimentos. Além do mais, nós temos uma criança linda. Eu ainda posso cuidar do Luke se eu for o Oráculo, certo?

Quíron tossiu.

– Sim, mas de qualquer maneira, eu não sei como isso afetará o espírito do Oráculo. Uma mulher que já pariu um filho - até onde eu sei, isso nunca foi feito antes. Se o espírito não aceitar...

– Ele irá – May insistiu.

Não, eu queria gritar. Não vai.

May Castellan beijou o bebê e o entregou a Hermes.

– Já volto.

Ela deu um último sorriso confiante a eles e subiu as escadas.

Quíron e Hermes permaneceram em silêncio. O bebê se mexia.

Um brilho verde saiu pelas janelas da casa. Os campistas param de jogar vôlei e olharam para o sótão. Um vento frio soprou pelos campos de morango.

Hermes deve ter sentido também. Ele gritou.

– Não! NÃO!

Ele entregou o bebê a Quíron e saiu correndo até o portão. Antes que ele alcançasse a porta, a tarde ensolarada foi cortada por um terrível grito de May Castellan.



Eu acordei tão depressa que bati com a cabeça no escudo de alguém.

– Ow!

– Desculpa, Percy – Annabeth estava parada em frente a mim. – Eu vim justamente para acordar você.

Eu esfreguei minha cabeça, tentando limpar as visões perturbadoras. De repente muitas coisas fizeram sentido para mim: May Castellan havia tentado se tornar o Oráculo. Ela não sabia da maldição de Hades que impedia o espírito de Delfos de se hospedar em outra pessoa. Nem Quíron nem Hermes. Eles não perceberam que, ao tentar conseguir o fardo, May ficaria maluca, atormentada com colapsos onde seus olhos brilhariam em verde e ela vislumbraria pedaços do futuro de seu filho.

– Percy? – Annabeth perguntou. – O que há de errado?

– Nada – eu menti. – O que... o que você está fazendo nesta armadura? Você deveria estar descansando.

– Ah, eu estou bem – ela disse, mas ainda parecia pálida. Ela mal mexia seu braço direito. – O néctar e a ambrósia deram um jeito em mim.

– Hã-hã. Sério, você não pode ir lá fora e lutar.

Ela me ofereceu sua mão boa e me ajudou a levantar. Minha cabeça latejava. Lá fora, o céu estava roxo e vermelho.

– Você vai precisar de cada pessoa que tiver – ela disse. – Eu acabei de olhar no meu escudo. Há um exército...

– Seguindo para o sul, marchando em direção ao Central Park – eu disse. – Sim, eu sei.

Eu contei parte dos meus sonhos. Eu deixei de fora a visão de May Castellan, pois era perturbadora demais pra falar. Eu também deixei passar a especulação de Ethan sobre Luke lutar contra Cronos dentro de seu corpo. Eu não queria alimentar as esperanças de Annabeth.

– Você acha que Ethan suspeita de seu ponto fraco? – ela perguntou.

– Eu não sei – admiti. – Ele não disse nada a Cronos, mas se ele descobrir...

– Nós não podemos deixar.

– Vou bater mais forte na cabeça dele da próxima vez – eu sugeri. – Alguma ideia sobre o que seria a surpresa de Cronos?

Ela balançou a cabeça.

– Eu não vi nada no escudo, mas não gosto de surpresas.

– Concordo.

– Então – ela disse – você vai discutir sobre eu me juntar a vocês?

– Nah. Você me venceria mesmo.

Ela deu risada, o que foi bom de ouvir. Eu peguei minha espada e fomos nos juntar às tropas.



Thalia e os chefes dos chalés nos esperavam no reservatório. As luzes da cidade brilhavam no crepúsculo. Eu acho que muitas delas estavam no timer automático. Candeeiros ardiam nas margens dos lagos, fazendo a água e as árvores parecerem ainda mais fantasmagóricos.

– Eles estão vindo – Thalia confirmou apontando uma flecha para o norte. – Uma das minhas batedoras acabou de me informar que eles já cruzaram o Rio Harlem. Não houve modo de pará-los. O exército... – ela se encolheu – é imenso.

– Nós vamos segurá-los no parque – eu disse. – Grover, vocês estão preparados?

Ele assentiu.

– Mais preparados como jamais estaremos. Se meus espíritos podem detê-los em algum lugar, é aqui.

– Sim, estamos, sim! – disse uma outra voz.

Um sátiro muito velho e gordo espremeu-se entre a multidão, tropeçando em sua própria lança. Ele vestia uma armadura de casca de árvore que só cobria metade de sua barriga.

– Leneu? – eu disse.

– Não fique tão surpreso – ele bufou. – Eu sou um líder do Conselho e você me pediu para achar Grover. Bom, eu o encontrei e não vou deixar um mero exilado liderar os sátiros sem a minha ajuda!

Às costas de Leneu, Grover fingia vomitar, mas o velho sátiro sorria como se fosse o salvador do dia.

– Jamais temeis! Nós vamos mostrar aos titãs!

Eu não sabia se ria ou se ficava com raiva, mas consegui me manter firme.

– Hum... é. Bem, Grover, você não estará sozinho. Annabeth e o chalé de Atena postarão guarda aqui. E eu e... Thalia?

Ela me deu um tapinha no ombro.

– Não diga mais nada. As Caçadoras estão prontas.

Eu olhei para os outros chefes de chalé.

– Isto deixa vocês com uma tarefa igualmente importante. Vocês devem guardar as outras entradas para Manhattan. Vocês sabem o quão complicado Cronos é. Ele tentará nos distrair com o exército grande e se infiltrar por outro lugar. Vocês devem garantir que isso não ocorra. Cada chalé já escolheu sua ponte ou túnel?

Os chefes assentiram, sérios.

– Então vamos – eu disse. – Boa caçada a todos!



Nós ouvimos o exército antes de enxergá-lo.

O barulho era como uma barragem de canhões combinados com um estádio de futebol lotado – como se todos os patriotas da Nova Inglaterra estivessem nos atacando com bazucas.

Ao norte do reservatório, a vanguarda inimiga avançou pelas árvores – um guerreiro numa armadura dourada liderando um batalhão de Lestrigões gigantes com enormes machados de bronze. Centenas de outros monstros vinham logo atrás deles.

– Posições! – Annabeth gritou.

Seus colegas de chalé subiram. A ideia era quebrar o exército inimigo em volta do reservatório. Para chegar até nós, eles teriam que vir pela trilha, o que significava que eles teriam de marchar em fila indiana por cada lado da água.

A primeira vista, o plano parecia funcionar. O inimigo se dividiu e avançou pela margem. Quando eles estavam na metade do caminho, nossas defesas agiram. A pista de caminhada explodiu em fogo grego, incinerando muitos monstros instantaneamente. Outros dispararam ao redor, envoltos em chamas verdes. Os campistas de Atena jogavam ganchos de quatro pontas nos gigantes e os puxavam até caírem no chão.

Das árvores da direita, as Caçadoras dispararam uma saraivada de flechas prateadas na linha inimiga, destruindo vinte ou trinta dracaenae, mas mais marcharam atrás delas. Um raio estalou pra fora dos céus e incinerou um Lestrigão até virar cinzas, e eu pensei que a Thalia devia estar fazendo uso daquela coisa de ser filha de Zeus.

Grover pegou sua flauta e tocou uma rápida melodia. Um rugido veio do bosque, como se toda árvore, pedra ou arbusto estivessem brotando espíritos. Dríades e sátiros se juntaram e atacaram. As árvores envolveram os monstros, esmagando-os. Grama se elevou em volta dos arqueiros inimigos. Pedras voaram e acertaram os rostos das dracaenae.

O inimigo forçou o passo adiante. Gigantes esmagaram árvores e as náiades desapareciam enquanto suas fontes de vida eram destruídas. Cães infernais investiram contra os lobos, derrubando-os. Os arqueiros inimigos retaliaram e uma Caçadora caiu de um galho no alto.

– Percy! – Annabeth pegou meu braço e apontou para o reservatório.

O Titã dourado não estava esperando que suas tropas avançassem pelos flancos. Ele investia diretamente contra nós, caminhando sobre a superfície da água. Uma bomba de fogo grego explodiu bem em cima dele, mas ele estendeu a mão e tirou as chamas do ar.

– Hiperíon – Annabeth disse com temor. – O senhor da luz. Titã do Oriente.

– Ruim? – eu adivinhei.

– Perto de Atlas, ele é o maior dos guerreiros Titãs. No passado, quatro Titãs controlaram os quatro cantos do mundo. Hiperíon ficou com o leste - o mais poderoso. Ele era o pai de Hélio, o primeiro deus do Sol.

– Vou mantê-lo ocupado – prometi.

– Percy, nem mesmo você pode...

– Apenas mantenha nossas forças unidas.

Nós nos fixamos no reservatório por um bom motivo. Eu me concentrei na água e senti seu poder fluindo em mim.

Eu avancei contra Hiperíon, correndo através da água. É, meu camarada. Nós dois podemos brincar desse jogo.

A uns cinco metros de distância, Hiperíon ergueu sua espada. Seus olhos eram como quando eu os vi no meu sonho – tão dourados quanto os de Cronos, mas mais brilhantes como mini sóis.

– O deus do mar é um fedelho – ele falou. – Foi você quem entregou o céu a Atlas novamente?

– Não foi difícil – eu disse. – Vocês Titãs são tão brilhantes quanto minhas meias de ginástica.

Hiperíon rosnou.

– Você quer brilho?

Seu corpo se transformou numa coluna de luz e calor. Eu desviei o olhar, mas continuei cego.

Instantaneamente eu ergui Contracorrente – bem a tempo. A espada de Hiperíon colidiu contra a minha. A onda de choque emanou uma onda de três metros sobre a superfície do lago.

Meus olhos ainda queimavam. Eu tive que acabar com a luz dele. Concentrei-me na onda e a forcei a voltar. Logo antes do impacto, eu saltei pra cima num jato d’água.

– AHHHHHH! – As ondas encontraram Hiperíon e ele submergiu, sua luz se extinguindo.

Eu caí na água enquanto Hiperíon lutava para se manter de pé. Escorria água de sua armadura dourada. Seus olhos não chamejavam mais, mas ainda pareciam assassinos.

– Você há de queimar, Jackson! – Ele rugiu.

Nossas espadas se encontraram novamente e o ar se encheu de ozônio. A batalha ainda corria a nossa volta. No flanco direito, Annabeth liderava um ataque com seus irmãos. No esquerdo, Grover e seus espíritos da natureza se reagrupavam, infernizando os inimigos com arbustos e ervas daninhas.

– Chega de jogos – Hiperíon me disse. – Lutamos na terra.

Eu estava para dizer um comentário inteligente, como “Não”, quando o Titã gritou. Uma parede de força se chocou contra mim no ar – o mesmo truque que Cronos havia usado na ponte. Eu fui arremessado cerca de trezentas jardas para trás e capotei no chão. Se não fosse pela minha invulnerabilidade, eu teria quebrado cada osso do meu corpo.

Eu fiquei de pé e lamentei.

– Eu realmente odeio quando vocês, titãs, fazem isso.

Hiperíon se aproximou de mim numa velocidade ofuscante.

Eu me concentrei na água, adquirindo forças.

Hiperíon atacou. Ele era rápido e poderoso, mas não parecia que ele acertaria o golpe. O chão em volta do pé dele continuava a pegar fogo, mas eu continuava a apagá-lo logo em seguida.

– Pare! – o Titã rugiu. – Pare com esse vento!

Eu não entendi bem o que ele quis dizer. Eu estava ocupado demais lutando. Hiperíon tropeçou como se estivesse sendo puxado de volta. Água jorrou em seu rosto, ferroando-lhe os olhos. O vento aumentou, e Hiperíon cambaleou para trás.

– Percy? – Grover me disse espantado. – Como você está fazendo isso?

Fazendo o que? Eu pensei.

Então eu olhei para baixo e percebi que estava no centro do meu próprio furacão. Nuvens de vapor d’água girava ao meu redor, ventos tão fortes que feriam Hiperíon e amassava a grama num raio de vinte metros. Guerreiros inimigos arremessaram javalis contra mim, mas eles voaram de lado.

– Maravilha – murmurei. – Mas eu quero mais!

Relâmpagos cintilaram ao meu redor. As nuvens enegreceram e a chuva girou mais depressa. Eu me aproximei de Hiperíon e o levantei do chão.

– Percy! – Grover falou de novo. – Traga ele aqui!

Eu bati e golpeei, deixando meus reflexos me controlarem. Hiperíon mal podia se defender. Seus olhos continuavam tentando se acender, mas o furacão apagava as chamas.

Entretanto, eu não poderia segurar uma tempestade dessas pra sempre. Eu podia sentir meu poder se esvaindo. Com um último esforço, empurrei Hiperíon sobre o campo até onde Grover estava.

– Não deixarei que brinquem comigo! – Hiperíon gritou.

Ele começou a se levantar, mas Grover pegou sua flauta e começou a tocar. Leneu o acompanhou. Pelo bosque, cada sátiro entrou na melodia – uma melodia estranha, como um rio correndo sobre pedras. O chão se rasgou sob os pés de Hiperíon. Raízes nodosas envolveram suas pernas.

– O que é isso? – Ele protestou. Ele tentou se livrar das raízes, mas ainda estava fraco. As raízes engrossaram até que ele parecia estar usando botas de madeira. – Parem com isso! – ele gritou. – Sua magia silvestre não é párea para um titã!

Mas quanto mais ele se contorcia, mais as raízes cresciam. Elas se enrolaram em seu corpo, transformando ele numa casca. Sua armadura dourada se misturou com a madeira, fazendo parte de um grande tronco.

A música continuou. O exército de Hiperíon recuou com espanto enquanto seu líder era absorvido. Ele esticou os braços que se tornaram galhos, de onde saíram galhos menores e folhas. A árvore cresceu mais e mais até que apenas o rosto do titã era visível no meio do tronco.

– Vocês não podem me aprisionar! – ele berrou. – Eu sou Hiperíon! Eu sou...

A casca cobriu seu rosto.

Grover tirou a flauta da boca. 

– Você deu uma árvore muito legal.

Muitos sátiros desmaiaram de exaustão, mas eles cumpriram bem seu trabalho. O lorde Titã estava completamente coberto por um carvalho. O tronco tinha pelo menos seis metros de diâmetro, com galhos tão grandes quanto qualquer um no parque. A árvore parecia estar ali há séculos.

O exército do Titã começou a bater em retirada. Aplausos vieram do chalé de Atena, mas nossa vitória foi cantada precipitadamente.

Porque só aí Cronos mostrou sua surpresa.



– RIIIIIII!

O guincho penetrou Manhattan. Semideuses e monstros congelaram. Grover olhou para mim em pânico.

– Por que este som se parece com... não pode ser!

Eu sabia o que ele estava pensando. Dois anos atrás nós recebemos um “presente” de Pan – um javali gigante que nos carregou pelo sudoeste (depois de tentar nos matar). O javali tinha um guincho parecido, mas o que nós tínhamos ouvido agora parecia maior e mais estridente, quase como se... como se o javali tivesse uma namorada aborrecida.

– RIIIIIIIIIII!

Uma criatura gigantesca e rosa planou sobre o reservatório – um dirigível do dia de ação de graças com asas.

– Uma porca! – Annabeth exclamou. – Protejam-se!

Os semideuses fugiram enquanto a porca atacava. Suas asas eram da cor de um flamingo, combinando perfeitamente com seu tom de pele, mas era impossível pensar nela como uma graça enquanto seus cascos batiam no chão, raspando num dos irmãos de Annabeth. A porca pisou e destruiu cerca de dois mil metros quadrados de árvores, arrotando uma nuvem de gases nocivos. Ele decolou de novo, voando em círculos para um novo ataque.

– Não me diga que aquela coisa é da mitologia grega! – eu disse.

– Receio que sim – Annabeth disse. – A Porca Camoniana. Ela aterrorizou cidades na Grécia Antiga.

– Deixe-me adivinhar – eu disse. – Hércules a derrotou.

– Não – disse ela. – Até onde eu sei, nenhum herói conseguiu derrotá-lo.

– Perfeito – eu murmurei.

O exército Titã estava se recuperando do choque. Acho que eles perceberam que a porca não estava atrás deles.

Nós tínhamos apenas segundos antes que eles estivessem prontos para lutar, e nossas forças ainda estavam em pânico. Toda vez que a porca arrotava, os espíritos da natureza de Grover ganiam e voltavam pras florestas.

– Aquela porca tem que ir embora. – Eu peguei um gancho de um dos irmãos de Annabeth. – Eu dou conta dela. Vocês cuidam do exército. Empurrem-nos de volta!

– Mas Percy – Grover disse. – E se nós não pudermos?

Eu vi o quão cansado ele estava. A mágica tinha realmente drenado suas forças. Annabeth não parecia muito melhor depois de ter lutado com o ombro machucado. Eu não sei como as Caçadoras estavam se saindo, mas o flanco direito do inimigo estava agora entre elas e nós.

Eu não queria deixar meus amigos na pior, mas aquela porca era a ameaça maior. Ela destruiria tudo: edifícios, árvores, mortais adormecidos. Ela tinha que ser parada.

– Recue se precisar – eu disse. – Apenas atrasem-nos. Eu voltarei assim que puder.

Antes que pudesse mudar de ideia, eu estava girando o gancho como um laço. Quando a porca veio para a próxima investida, eu arremessei com toda a minha força. O gancho enroscou-se na base da asa da porca. Ele gritou de raiva e se afastou, levando a corda comigo junto para o céu.



Se você tiver que andar pelo Central Park, sugiro que pegue o metrô. Porcas voadoras são mais rápidas, mas muito mais perigosos.

A porca sobrevoou o Plaza Hotel, direto até o cânion da quinta avenida. Meu plano brilhante era subir na corda até a porca e montar suas costas. Infelizmente eu estava muito ocupado balançando e me desviando dos postes e das laterais dos prédios.

Outra coisa que eu aprendi: uma coisa é subir uma corda na academia. Outra é você tentar subir uma corda balançando presa à asa de uma porca enquanto você voa a 160 quilômetros por hora.

Ziguezagueamos por vários quarteirões e continuamos seguindo para o sul sobre a Park Avenue.

Chefe! Hey chefe! Entrando no meu campo de visão eu vi Blackjack se aproximando e tomando cuidado para não acertar as asas da porca.

– Cuidado! – eu avisei.

Salte! Blackjack relinchou. Eu pego você... eu acho.

Não era muito tranquilizador. O terminal Grand Central estava logo a frente. Na entrada, a gigantesca estátua de Hermes, que eu acredito não ter sido ativada por causa da altura. Eu estava voando em direção a ela numa velocidade capaz de esmagar um semideus.

– Fique alerta – falei para Blackjack. – Eu tive uma ideia.

Oh, eu odeio as suas ideias.

Eu me joguei para o lado com toda a força. Ao invés de me esmagar contra a estátua, eu girei em torno dela, enrolando a corda nos braços dela. Eu pensei que isso prenderia a porca, mas eu subestimei a força cinética de um porco de trinta toneladas em pleno voo. Assim que a porca arrancou a estátua do pedestal, eu a deixei ir. Hermes foi dar uma voltinha, tomando meu lugar como carona da porca, e eu caí em queda livre até a rua.

Naquele segundo eu me lembrei de quando minha mãe trabalhava numa loja de doces da Grand Central. Eu pensei em como seria ruim terminar como uma massa estatelada no chão.

Então uma sombra passo sob mim e então thump – eu estava nas costas de Blackjack. Não foi a aterrissagem mais confortável. Na verdade, quando eu gritei “AI!” minha voz saiu uma oitava acima do normal.

Desculpe, chefe, murmurou Blackjack.

– Sem problemas – guinchei. – Siga aquela porca!

A porca virou a direita na 42 Leste e estava voando de volta para a Quinta Avenida. Quando ela passou pelos telhados, eu podia ver alguns incêndios aqui e ali na cidade. Meus amigos estavam tendo sérios problemas. Cronos estava atacando em vários lugares. Mas naquele momento, eu tinha meus próprios problemas.

A estátua de Hermes ainda estava amarrada. Ela continuava batendo nos prédios e balançando. A porca passou por uma oficina, e Hermes bateu numa caixa d’água no telhado, esparramando água e madeira pra todo lado. Então me ocorreu algo.

– Chegue mais perto – eu falei pro Blackjack.

Ele relinchou em protesto.

– Só a uma distância razoável – eu disse. – Eu preciso falar com a estátua.

Agora eu tenho certeza que você está perdido, chefe, Blackjack disse, mas fez o que eu pedi. Quando eu estava perto o suficiente para olhar o rosto da estátua, eu disse:

– Olá Hermes! Sequência de comando: Dédalo Vinte e Três. Matar Porcos Voadores. Começar ativação!

Imediatamente a estátua começou a mexer as pernas. Ela parecia confusa ao perceber que não estava mais no Terminal Grand Central. Ao invés disso, ela estava presa a uma corda puxada por uma grande porca voadora. Ela chocou-se contra uma parede de tijolos, o que eu acho que a deixou meio nervosa. Ela balançou a cabeça e começou a subir na corda.

Eu olhei de volta para a rua. Estávamos nos aproximando da biblioteca municipal, com os grandes leões de mármore flanqueando as entradas. De repente, eu tive um pensamento irado: As estátuas de pedra poderiam ser autômatos também? Parecia louco, mas...

– Mais rápido – eu falei pro Blackjack. – Fique a frente da porca. Insulte-a.

Hum chefe ...

– Confie em mim – eu disse. – Eu posso fazer isso... eu acho.

Oh, claro. Engane o cavalo.

Blackjack explodiu adiante pelo ar. Ele podia voar realmente rápido quando precisava. Ele chegou à frente da porca, que tinha um Hermes de metal nas costas. Blackjack relinchou.

Você fede como presunto! Ele deu um coice no focinho da porca com seu casco traseiro e mergulhou. A porca rugiu de raiva e seguiu.

Nós paramos a alguns passos da biblioteca. Blackjack diminuiu o suficiente para eu desmontar, depois continuou em direção a porta.

Eu gritei:

– Leões! Sequência de comando: Dédalo Vinte e Três. Matar Porcos Voadores. Iniciar ativação!

Os leões ficaram e me fitaram. Eles deviam achar eu estava brincando com eles. Mas então:

– RIIIIIIIIIII!

O enorme monstro maciço e cor-de-rosa aterrissou com um baque, rachando a calçada. Os leões o encaram, não acreditando em sua sorte e saltaram sobre ele. Ao mesmo tempo, um Hermes muito raivoso pulou na cabeça da porca e começou a bater impiedosamente nela com um caduceus. Os leões tinham garras bem antipáticas.

Eu peguei Contracorrente, mas não havia muito que fazer. A porca se desintegrou diante de meus olhos. Eu quase me senti culpado. Esperei que ela encontrasse o javali dos sonhos no Tártaro.

Quando a porca se esvaiu totalmente em areia, a estátua de Hermes e os leões ficaram confusos.

– Vocês podem defender Manhattan agora – eu falei, mas eles não pareciam me ouvir. Eles começaram a correr pela Park Avenue, e eu imaginei que eles continuariam a procurar porcos voadores ate que alguém os desativasse.

Hey, chefe, Blackjack disse. Podemos fazer uma pausa para comer Donuts?

Eu limpei o suor da sobrancelha.

– Eu adoraria, grandão, mas a luta ainda está rolando.

Na verdade, eu podia senti-la chegando mais perto. Meus amigos precisavam de ajuda. Eu montei Blackjack e nós voamos na direção dos sons das explosões.

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