sábado, 31 de agosto de 2013

O ultimo olimpiano - capitulo 9




                              Duas cobras salvam minha vida       

Eu amo Nova York. Você pode sair do Mundo Inferior para o Central Park, chamar um táxi, virar a Quinta Avenida de cabeça para baixo com um gigantesco cão infernal galopando bem atrás de você, e ninguém te olha engraçado. É claro, a Névoa ajuda.

As pessoas provavelmente não poderiam ver a Sra. O’leary, ou talvez elas pensassem que era um grande, carregado e amigável caminhão.

Eu corri o risco de usar o celular de minha mãe para chamar Annabeth pela segunda vez. A primeira vez foi quando eu estava no túnel, mas só consegui ouvir a secretária eletrônica. O sinal estava surpreendentemente bom, visto que eu estava no centro mitológico do mundo, mas eu não gostaria de saber quanto minha mãe teria que pagar pela chamada.

Desta vez, Annabeth atendeu.

– Hey – eu disse. – Você pegou a minha mensagem?

– Percy, onde esteve? Sua mensagem não dizia quase nada! Ficamos preocupados!

– Mais tarde eu te conto – eu disse, mas como eu ia fazer aquilo não tinha ideia. – Onde você está?

– Estamos a caminho como você pediu, quase no túnel do Queens para Midtown. Percy, o que está planejando? Já deixou o acampamento praticamente indefeso, e não há possibilidades de os deuses...

– Confie em mim – eu disse – vejo vocês lá.

Eu desliguei. Minhas mãos estavam tremendo. Eu não tinha certeza se era uma reação do meu mergulho no Estige, ou antecipando o que estava prestes a fazer.

Se isso não funcionar, mesmo sendo invulnerável não ia conseguir me safar de ser explodido em pedaços.



Era tarde, quando o táxi me deixou no Edifício Empire State.

Sra. O'Leary andava para cima e para baixo na quinta avenida, lambendo táxis e cheirando carrinhos de cachorro quente. Ninguém parecia notá-la, embora as pessoas olhassem confusas quando ela chegava perto demais.

Eu assobiei para ela, então vi três vans brancas puxando o freio ao mesmo tempo. Dizia Delphi Strawberry Service, que era o nome de disfarce do Acampamento Meio-Sangue. Eu sabia que eles entregavam nossas frutas frescas na cidade, mas nunca tinha visto três vans ao mesmo tempo.

Argos vinha dirigindo a primeira van, nosso chefe de segurança de muitos olhos, as outras duas estavam sendo dirigidas pelas harpias que basicamente eram demônios, metade humano metade galinha com péssimas atitudes.

Usamos as harpias principalmente para a limpeza do acampamento, mas elas estavam se saindo muito bem no centro da cidade no meio do tráfego.

Abriram as portas. Um punhado de campistas começou a saltar para fora, alguns deles procuravam um pouco de ar puro depois da longa viagem. Eu fiquei feliz que tantos tinham chegado: Pólux, Silena Beauregard, os irmãos Stoll, Michael Yew, Jake Mason, Katie Gardner, e Annabeth, juntamente com a maioria dos seus irmãos.

Quíron saiu da van por último. Sua metade cavalo estava compactada por meio de magia dentro de sua cadeira de rodas, então ele usou o elevador adaptado na van. Ninguém do chalé de Ares estava aqui, mas eu tentei não ficar com muita raiva. Clarisse era uma obstinada idiota. Fim da história.

Eu fiz uma contagem: Quarenta campistas, nem todos muito preparados para lutar uma guerra, mas ainda era o maior grupo de meios-sangues que já tinha visto fora do acampamento. Todo mundo parecia nervoso, e eu entendia por quê. Nós estávamos enviando uma aura de semideuses tão forte, que todos os monstros ao nordeste dos Estados Unidos, saberiam que estávamos aqui.

Eu olhei para seus rostos – eu estive com eles por muitos verões, entretanto uma voz sussurrava em minha mente: Um deles é um espião.

Mas eu não podia pensar sobre isso agora, eles eram meus amigos e eu precisava deles. Então me lembrei do sorriso maligno de Cronos. Não se pode contar com os amigos. Eles sempre vão desapontá-lo.

Annabeth veio até mim. Ela estava vestida com roupa de camuflagem preta, com sua faca de bronze celestial presa ao seu braço e sua bolsa do laptop pendurada em seus ombros, pronta para guerra, ou navegar na Internet, o que vier primeiro.

Ela franziu as sobrancelhas.

– O que foi?

– O que foi o quê? – Eu perguntei.

– Você está olhando para mim de um jeito engraçado.

Realmente, eu estava pensando sobre a minha estranha visão de Annabeth me puxando do rio Estige.

– É, uh, nada.

Eu virei para o resto do grupo.

– Obrigado por todos estarem aqui. Quíron, depois de você. – Meu velho mentor balançou sua cabeça. – Eu vim para desejar-lhe sorte, meu rapaz. Mas eu não posso visitar o Olimpo sem ser convidado.

– Mas você é o nosso líder.

Ele sorriu.

– Eu sou o seu treinador, o seu professor. Isso não é o mesmo que ser o seu líder. Vou reunir os aliados que eu puder. Não pode ser demasiado tarde para eu convencer os meus irmãos centauros a nos ajudar. Entretanto, você chamou os campistas até aqui, Percy. Você é o líder.

Eu queria protestar, mas todos estavam olhando para mim com expectativa, mesmo Annabeth. Eu tomei fôlego.

– Ok, como eu disse a Annabeth ao telefone, alguma coisa ruim vai acontecer esta noite. Algum tipo de armadilha. Temos que conseguir uma audiência com Zeus e convencê-lo a defender a cidade. Lembre-se, não podemos receber um não como resposta.

Eu pedi para Argos ficar de olho na Sra. O'Leary, por que nenhum dos outros parecia feliz com a ideia.

Quíron apertou a minha mão.

– Você vai se sair bem, Percy. Basta lembrar-se de seus pontos fortes e tomar cuidado com suas fraquezas.

Isso soou igual ao que Aquiles havia me dito.

Então me lembrei que Quíron tinha ensinado Aquiles. Isso exatamente não me tranquilizava, mas eu assenti com a cabeça e esbocei um sorriso confiante.

– Vamos – eu disse aos campistas.



O guarda de segurança estava sentado atrás de uma mesa no saguão, lendo um livro preto com desenho de flores nos cantos. Ele nos olhou quando ouviu o som metálico de nossas armas e escudos depositados bem em sua frente.

– Grupo escolar? Estamos prestes a fechar.

– Não! – Eu disse: – seiscentésimo andar.

Ele ficou nos observando. Seus olhos tinham um pálido azul, e ele era careca. Eu não poderia dizer se ele era humano ou não, mas ele parecia ver nossas armas, acho que ele não era enganado pela névoa.

– Não há seiscentésimo, rapaz. – Ele disse com um tom como se não acreditasse no que estava falando. – Vão embora.

Eu me inclinei sobre sua mesa.

– Quarenta semideuses podem atrair uma enorme quantidade de monstros. Você realmente quer que fiquemos aqui no seu saguão?

Ele pensou nisso. Então apertou um botão, soou uma buzina e um portão de segurança se abriu.

– Sejam rápidos.

– Você não quer que passemos por detectores de metais – eu adicionei.

– Hum, não – ele concordou. – Elevador da direita. Acho que você conhece o caminho.

Eu joguei para ele um Dracma de ouro e marchamos.

Decidimos que seria necessário, duas viagens para caber todos no elevador. Fui com o primeiro grupo.

Uma música diferente estava tocando desde minha última visita, “Stayin Alive”, da velha Discoteca. Uma imagem aterrorizante apareceu em minha mente, de Apolo com calças boca de sino e uma camisa de seda apertada.

Fiquei feliz quando finalmente as portas do elevador se abriram.

Em frente de nós, no meio de nuvens, um caminho de pedras flutuantes levava até o Monte Olimpo, que pairava a dois mil metros sobre Manhattan. Eu já fui ao monte Olimpo, mas é sempre de tirar o fôlego.

As mansões ao lado da montanha reluziam a ouro e branco. Jardins floresciam em uns cem terraços. Fumaça com aroma de rosas subia dos braseiros alinhados nas ruas tortuosas. E uma fica camada de neve cobria o palácio principal dos deuses. Parecia tão majestoso como nunca. Mas alguma coisa parecia errada. Percebi que a montanha estava silenciosa, sem música, sem vozes, sem riso.

Annabeth me estudou.

– Você parece... diferente – ela decidiu. – Aonde exatamente você foi?

O elevador abriu as portas novamente, o segundo grupo de meios-sangues se juntou a nós.

– Conto mais tarde. – Eu disse. – Vamos.

Nós pegamos nosso caminho pela estrada de pedras suspensa no céu, através das ruas do Olimpo. As lojas estavam fechadas. Os parques estavam vazios. Um casal de Musas sentadas em um banco tocava liras flamejantes, mas seus corações não pareciam alegres.

Um solitário Ciclope varria a rua com uma vassoura de raiz de carvalho. Uma pequena deusa nos avistou de sua varanda e esquivou-se para o interior, fechando sua porta.

Passamos por um grande arco com estátuas de mármore, Zeus e Hera, em ambos os lados. Annabeth fez uma careta para a rainha dos deuses.

– Eu a odeio – murmurou.

– Ela amaldiçoou você ou algo assim? – Eu perguntei.

No último ano, Annabeth viu o lado ruim de Hera, desde então não tinha falado muito sobre o assunto.

– Só pequenas coisas até agora – disse ela. – Seu animal sagrado é a vaca, certo?

– Certo.

– Então, ela manda as vacas atrás de mim.

Tentei não rir.

– Vacas? Em São Francisco?

– Oh, sim. Normalmente eu não as vejo, mas elas deixam um pequeno presente em todo o lugar, no nosso quintal, na calçada, nos corredores da escola. Tenho que ter cuidado onde piso.

– Olhem! – Pólux gritou, apontando para o horizonte. – O que é aquilo?

Nos todos congelamos. Luzes azuis rasgavam o anoitecer em direção Olimpo como minúsculos cometas. Pareciam estar vindo de toda a cidade, em linha reta na direção da montanha, quando se encontravam emitiam um zumbido. Nós ficamos ali assistindo por vários minutos e não parecia estar causando qualquer dano, mas ainda assim era estranho.

– Lembram miras a laser – Michael Yew murmurou. – Estão mirando em nós.

– Vamos para o palácio – eu disse.

Ninguém estava guardando a sala dos deuses. O portão de ouro e prata estava totalmente aberto. Nossos passos ecoavam enquanto caminhávamos na sala do trono.

Claro, "sala" realmente não é preciso vigiá-las. O local era do tamanho do parque Madison Square. Bem acima, brilhavam constelações em azul. Doze tronos gigantes e vazios se situavam em forma de um U em volta de uma lareira. Em um canto, uma esfera de água do tamanho de uma casa pairava no ar, e dentro dela nadava meu velho amigo Ofiotauro, metade-vaca, metade-serpente.

– Muuuu! – Disse alegremente, girando em um círculo.

Apesar de todas as coisas sérias acontecendo, eu tive que sorrir. Há dois anos eu gastei muito tempo tentando salvar o Ofiotauro dos Titãs, estava feliz em vê-lo novamente. Ele parecia gostar de mim também, mesmo que quando o conheci pensei que fosse uma garota e coloquei o nome de Bessie.

– Ei cara – eu disse. – Eles estão te tratando bem?

– Muuuu – Bessie respondeu.

Começamos a andar ao redor dos tronos, então uma voz de mulher disse:

– Olá novamente Percy Jackson. Você e seus amigos são bem vindos.

Héstia estava parada em frente à lareira, atiçando o fogo com uma vara. Ela usava o mesmo tipo de vestido marrom simples que usara antes, mas agora era uma mulher crescida.

Eu a saudei.

– Lady Héstia.

Meus amigos seguiram meu exemplo.

Héstia me considerou com seus grandes olhos flamejantes.

– Eu vi até onde você foi com seu plano. Está carregando a maldição de Aquiles.

Os campistas começaram a murmurar entre si.

– O que você disse? O que, a respeito de Aquiles?

– Você deve ter cuidado – Héstia me falou. – Você conquistou muito em sua jornada. Mas ainda está cego em relação a mais importante verdade. Talvez um vislumbre lhe esclareça.

Annabeth me cutucou.

– Hum... do que ela está falando?

Eu fitei os olhos de Héstia e uma imagem correu pela minha mente: Eu vi um beco escuro entre paredes de tijolos de armazéns, em uma das portas numa placa se lia METALÚRGICA RICHMOND.

Dois meios-sangues encolhidos nas sombras, um garoto de 14 e uma garota de 13 anos. Eu consegui ver que o garoto era Luke. A garota era Thalia, filha de Zeus.

Eu estava vendo uma cena do passado quando os dois estavam em em fuga, antes de Grover os encontrar.

Luke carregando uma faca de bronze. Thalia tinha sua lança e o escudo do terror, Aegis. Luke e Thalia pareciam famintos e magros, com os olhos de animais selvagens, como se eles estivessem sendo atacados.

– Tem certeza? – Thalia perguntou.

Luke assentiu.

– Há alguma coisa aqui em baixo. Eu sinto.

Um estrondo ecoou do beco, como se alguém tivesse batido em uma folha de metal. Os meios-sangues rastejaram em frente. Velhas grades estavam amontoadas na doca. Thalia e Luke aproximaram-se com suas armas prontas. Uma cortina ondulada tremia de forma estanha como se algo estivesse atrás dela.

Thalia olhou para Luke. Ele estava silenciosamente contando. Um, dois, três! Ele puxou rápido, a cortina e uma pequena garota voou para cima dele com um martelo.

– Whoa! – Luke disse.

A menina tinha cabelos loiros emaranhados e estava usando calça de pijama de flanela. Ela não poderia ter vantagem contra eles, mas ela teria afundado a cabeça de Luke se ele não tivesse sido tão rápido.

Ele agarrou seu pulso, o martelo caiu no chão de cimento.

A pequena menina lutou e chutou.

– Não há mais monstros! Foram embora!

– Está tudo bem! – Luke lutando para segurá-la. – Thalia, abaixe seu escudo. Você está assustando ela.

Thalia deu uma batida em Aegis, que encolheu e virou uma pulseira de prata.

– Ei, está tudo certo – disse ela. – Não vamos te machucar. Eu sou Thalia, e este é o Luke.

– Monstros!

– Não – Luke falou. – Mas sabemos tudo sobre os monstros. Lutamos com eles também.

Lentamente, a menina parou de bater. Estudou Thalia e Luke com olhos grandes cinzentos e inteligentes.

– Vocês são iguais a mim? – Disse ela suspeita.

– Sim – disse Luke. – Somos... bem, é difícil de explicar, mas lutamos contra os monstros. Onde está sua família?

– A minha família me odeia – a menina disse. – Eles não me querem. Eu fugi.

Thalia e Luke fecharam os olhos. Eu sabia que ambos sabiam exatamente o que ela estava dizendo.

– Qual é o seu nome, garota? – Thalia perguntou.

– Annabeth.

Luke sorriu.

– Bonito nome. Te digo uma coisa, Annabeth do rosto bonito. Nós poderíamos usar uma lutadora como você.

Os olhos de Annabeth brilharam.

– Vocês poderiam?

– Oh, sim. – Luke virou sua faca ao contrário e ofereceu o cabo a ela. – Você gosta de uma verdadeira arma degoladora de monstros? É bronze celestial. Funciona muito melhor do que um martelo.

Em outras circunstâncias, oferecer uma faca a uma garota de sete anos de idade, não seria uma boa ideia, mas quando se é um meio-sangue, podemos jogar fora algumas regras. Annabeth agarrou a cabo.

– Facas são apenas para os mais rápidos e bravos guerreiros – Luke explicou. – Ela não têm alcance ou o poder de uma espada, mas são fáceis de esconder e podem encontrar pontos fracos na armadura de seus inimigos. Um guerreiro inteligente possui uma faca. Eu tenho a sensação de que você é muito inteligente.

Annabeth olhava para ele com adoração.

– Eu sou!

Thalia forçou um sorriso.

– É melhor nos irmos, Annabeth. Nós temos uma casa segura sobre o rio James. Vamos te dar comida e roupas.

– Você não... você não vai me levar de volta à minha família? – disse ela. – Promete?

Luke colocou a mão sobre seu ombro.

– Você é parte da nossa família agora. E eu prometo que não vou deixar nada te machucar. E não vou desapontá-la, você vai gostar de nós. Fechado?

– Fechado! – Annabeth disse feliz.

– Agora, vamos – Thalia disse. – Não podemos nos demorar!

A cena deslocou-se. Os três semideuses estavam correndo através de um bosque. Deve ter sido vários dias depois, talvez mesmo semanas. Todos eles pareciam abatidos, como se eles tivessem passado por algumas batalhas. Annabeth estava de roupas novas, jeans e uma jaqueta grande do exército.

– Só mais um pouco! – Luke falou.

Annabeth tropeçou, e ele pegou a mão dela. Thalia vinha na retaguarda, brandindo seu escudo como ela estive perseguindo a coisa que estava atrás deles. Ela estava mancando da perna esquerda. Subiram num cume e olharam para o outro lado, vendo uma casa branca colonial. Devia ser a casa dos Castellans.

– Certo – Luke disse, respirando com dificuldade. – Só vou entrar para pegar alguns alimentos e medicamentos, esperem aqui.

– Luke, tem certeza? – Thalia perguntou. – Você jurou que nunca mais voltaria aqui. Se ela te apanhar...

– Nós não temos escolha! – murmurou. – Eles queimaram nossa casa mais próxima e segura. E você tem que tratar essa perna ferida.

– Esta é a sua casa? – Annabeth disse com espanto.

– Foi a minha casa – Luke murmurou. – Acredite em mim, se não fosse uma emergência...

– Sua mãe é tão horrível assim? – Annabeth perguntou. – Posso conhecê-la?

– Não! – Luke rangeu os dentes.

Annabeth se encolheu, surpresa com a raiva de Luke.

– Eu... me desculpe – ele disse. – Espere aqui. Eu prometo que tudo ficará bem. Nada vai te machucar. Eu vou voltar.

Um flash dourado e brilhante iluminou a floresta. Os semideuses recuaram, e uma voz masculina rebombou:

– Você não deveria ter voltado para casa.



A visão se desfez.

Meus joelhos amoleceram, mas Annabeth me agarrou.

– Percy! O que aconteceu?

– Você viu isso? – Eu perguntei.

– Ver o quê?

Eu olhei para Héstia, mas o rosto da deusa era inexpressivo.

Lembrei-me de algo que ela me disse na floresta: Se você quer entender seu inimigo Luke, deve entender sua família. Mas por que ela tinha me mostrado essas cenas?

– Quanto tempo estive fora? – Eu murmurei.

Annabeth levantou suas sobrancelhas.

– Percy, você não foi a lugar nenhum. Você só olhou para Héstia um segundo e desmaiou.

Eu podia sentir que todos olhavam para mim. Não podia dar ao luxo de fraquejar. Seja lá o que for o significado das visões, eu tinha que me manter focado em nossa missão.

– Hum, Lady Héstia – eu disse – nós temos negócios urgentes - nós precisamos ver...

– Sabemos o que você precisa – disse uma voz masculina.

Eu estremeci, porque era a mesma voz que eu ouvi na visão. Um deus apareceu próximo a Héstia. Ele parecia ter uns vinte e cinco anos, cabelo encaracolado, cor de sal e pimenta, e feições élficas. Ele usava uma roupa de piloto militar de voo, com pequenas asas de pássaro vibrando em seu capacete e botas negras de couro. Em seu braço havia duas longas serpentes vivas entrelaçadas.

– Eu deixarei vocês agora – disse Héstia.

Ela curvou-se diante do aviador e desapareceu no meio de uma fumaça. Eu entendi porque ela estava tão ansiosa para ir. Hermes, o mensageiro dos Deuses, não parecia feliz.

– Olá, Percy.

Sua sobrancelha enrugou-se como se estivesse irritado comigo, e eu me perguntava se saberia algo de minha visão. Eu queria perguntar por que ele foi a casa de Luke aquela noite, e o que tinha acontecido depois de tê-lo capturado.

Lembrei-me da primeira vez que eu conheci Luke no Acampamento Meio-Sangue. Eu perguntei a ele se havia alguma vez conhecido o seu pai, olhou para mim e disse amargamente, uma vez. Mas pela expressão de Hermes era melhor eu não perguntar nada. Eu me curvei sem jeito.

– Senhor Hermes.

É claro, uma das serpentes disse na minha mente. Não vai falar oi pra nós. Só porque somos serpentes.

George, a outra serpente censurou. Seja educado.

– Olá, George – eu disse. – Oi, Martha.

Trouxe-nos um rato? George perguntou.

George, para com isso Martha disse.

Ele anda ocupado demais para procurar ratos? George disse. Isso é muito chato.

Eu decidi que era melhor não entrar em debate com o George.

– Hum, Hermes – eu disse. – Temos que falar com Zeus. É importante.

Hermes olhava friamente.

– Eu sou o seu mensageiro. Posso levar sua mensagem?

Atrás de mim, os outros semideuses agitaram-se. Isto não está saindo como eu planejei. Talvez devesse falar com Hermes em particular...

– Vocês – eu disse. – Por que vocês não vão fazer uma patrulha na cidade? Verifiquem as defesas. Vejam quem deixou o Olimpo. Encontrem Annabeth e eu aqui em trinta minutos.

Silena amarrou a cara.

– Mas...

– Essa é uma boa ideia – Annabeth disse. – Connor e Travis, você lideram.

Os Stolls pareciam gostar daquilo, lhes fora entregue uma responsabilidade importante em frente do seu pai. Eles nunca lideraram nada, exceto corrida de papel higiênico.

– Então vamos –Travis disse.

Eles levaram todos para fora da sala do trono, deixando-me com Annabeth e Hermes.

– Meu senhor – disse Annabeth. – Cronos vai atacar Nova York. Vocês devem suspeitar disso. Minha mãe deve ter previsto isso.

– Sua mãe – Hermes grunhiu. Ele coçou suas costas com o seu caduceu, e George e Martha reclamaram: ai, ai, ai.

– Não me fale de sua mãe, jovem senhorita. Ela é a razão do por que estou aqui e todo o resto. Zeus não queria que deixássemos a linha de frente. Mas sua mãe não parava de incomodá-lo e continuou “É uma armadilha, é uma distração, blá, blá, blá.” Ela disse que faria tudo sozinha, mas Zeus não queria que um grande número de estrategistas deixassem o seu lado então ninguém mais saiu, poderíamos estar lutando neste momento contra Tifão. E então naturalmente ele mandou-me para falar com você.

– Mas é uma armadilha! – Annabeth insistiu. – Zeus é cego por acaso?

Raios atravessaram os céus.

– Cuidado com os comentários, menina – Hermes alertou. – Zeus não é cego nem surdo. Ele não deixou o Olimpo indefeso.

– Mas há esses raios azuis...

– Sim, sim. Eu os vi. Alguma travessura daquela insuportável deusa da magia, Hécate, eu aposto, mas você pode ter certeza que não está causando nenhum dano. O Olimpo tem uma forte defesa mágica. Além disso, Éolo, o rei dos ventos, mandou o seu mais poderoso servo guardar a cidade, e ninguém a não ser os deuses do Olimpo podem entrar pelo ar. Seriam derrubados do céu.

Eu levantei minha mão.

– Hum ... E a materialização, coisas que vocês Deuses costumam fazer?

– Essa é uma forma de transporte aéreo também, Jackson. Muito rápido, mas o deus do vento é mais rápido. A não ser que Cronos queira tomar o Olimpo, ele vai ter que marchar por toda a cidade, fora que terá que subir de elevador! Você pode imaginar ele fazendo isso?

Hermes fez parecer bastante ridículo, imagine hordas de monstros subindo de elevador, vinte de cada vez, ouvindo "Stayin 'Alive." Mesmo assim, eu não gostei da ideia.

– Talvez alguns de vocês possam voltar – sugeri.

Hermes balançou a cabeça impacientemente.

– Percy Jackson, você não compreende. Tifão é o nosso maior inimigo.

– Eu pensei que fosse Cronos.

Os olhos de Hermes brilharam.

– Não, Percy. Nos velhos tempos, Tifão quase derrubou o Olimpo. Ele é marido de Equidna...

– Eu a conheci no arco – eu murmurei. – Nada agradável.

–... e o pai de todos os monstros. Nós nunca poderemos esquecer o quanto ele esteve próximo em nos destruir, e como ele foi humilhado. Éramos mais poderosos nos velhos tempos. Agora nem podemos esperar a ajuda de Poseidon, por que ele tem sua própria guerra para lutar. Hades se senta em seu reino e não faz nada, Deméter e Perséfone seguem o seu exemplo. Temos que juntar o poder remanescente e opor-se a gigante tempestade. Não podemos dividir nossas forças, nem esperar até que ele chegue a Nova York. Temos que batalhar com ele agora. E estamos fazendo progressos.

– Progresso? – Eu disse. – Ele quase destruiu St. Louis.

– Verdade – Hermes admitiu. – Mas ele destruiu apenas metade do Kentucky. Ele está diminuindo agora. Perdeu o poder.

Eu não queria argumentar, mas soou como se Hermes tentasse convencer a si mesmo. No canto, o Ofiotauro mugia tristemente.

– Por favor, Hermes – Annabeth falou. – Disse que a minha mãe viria. Ela deixou alguma mensagem para nós?

– Mensagens – ele murmurou. – “Será um excelente trabalho” disseram-me. “Sossegado. Com um monte de adoradores”. Humpf. Ninguém se importa com o que tenho a dizer. As mensagens são sempre sobre as outras pessoas.

Ratos, George meditou. Entrei nessa pelos ratos.

Shhhh, Martha o repreendeu. Nós nos importamos com o que tem a dizer Hermes. Certo George?

Oh, absolutamente. Podemos voltar para a batalha agora? Eu quero entrar no modo laser de novo. É divertido.

– Silêncio os dois – Hermes grunhiu.

O deus olhou para Annabeth, que estava implorando com os seus olhos cinzentos.

– Bah – Hermes disse. – Sua mãe disse para te avisar que você está por sua conta. Você deve ficar em Manhattan sem a ajuda dos deuses. Como se eu não soubesse disso. Por que eles pagam para ela ser a deusa da sabedoria, eu realmente não tenho certeza.

– Mais alguma coisa? – Annabeth perguntou.

– Ela disse que você deveria tentar o plano vinte e três. Disse que saberia o significado.

O rosto de Annabeth ficou pálido. É óbvio que ela sabia o que significava, e pelo jeito não gostou.

– Vá em frente.

– Última coisa – Hermes olhou para mim. – Ela me pediu que dissesse a Percy: “Lembre-se dos rios.” E algo sobre ficar longe de sua filha.

Não tenho certeza cujo rosto estava mais vermelho: O de Annabeth, ou o meu.

– Obrigado, Hermes – Annabeth disse. – E eu... eu queria dizer que... Eu sinto muito por Luke.

O deus endureceu sua expressão, como se ele tivesse virado mármore.

– Você poderia não ter tocado neste assunto.

Annabeth deu um passo atrás nervosamente.

– Desculpe?

– Desculpas não ajudam!

George e Martha enrolaram-se em volta do caduceu, que brilhou e se transformou em algo que parecia suspeitosamente como um marcador de gado com alta voltagem na ponta.

– Você deveria tê-lo salvado quando teve chance – Hermes grunhiu para Annabeth. – Você é a única que poderia ter ajudado.

Eu tentei ficar entre eles.

– Você está falando do quê? Annabeth nunca...

– Não defenda ela, Jackson! – Hermes virou o marcador de gado na minha direção. – Ela sabe exatamente do que estou falando!

– Você é quem deveria se culpar! – Eu deveria ter mantido minha boca fechada, mas tudo que eu pensava naquele momento era desviar a atenção dele para longe de Annabeth. Ele não estava bravo comigo, ele estava bravo com ela. – Talvez se você não tivesse abandonado Luke e sua mãe!

Hermes levantou seu marcador de gado. Ele começou a crescer até chegar a uns três metros de altura. Pensei, bem é isso. Mas, quando se preparou para o ataque, George e Martha se inclinaram e falaram algo bem perto de seus ouvidos.

Hermes serrou seus dentes. Ele baixou o marcador de gado e ele voltou às dimensões de um bastão.

– Percy Jackson – ele disse. – Apenas por que carrega a maldição de Aquiles, vou poupá-lo. Você está nas mãos do destino agora. Nunca mais fale assim comigo. Você não tem ideia de quanto eu tenho sacrificado, o quanto...

Sua voz quebrou, e ele voltou a dimensões humanas.

– Meu filho, meu maior orgulho... minha pobre May...

Ele parecia devastado e eu não sabia o que dizer. Um minuto atrás ele estava pronto para nos evaporar. Agora, ele parecia que estava precisando de um abraço.

– Olhe Senhor Hermes – eu disse. – Desculpe, mas eu preciso saber. O que aconteceu com a May? Ela disse algo sobre o destino de Luke, e seus olhos...

Hermes olhou furioso para mim, e minha voz vacilou.

O olhar em seu rosto não era realmente de raiva, era de dor. Profunda e incrível dor.

– Eu vou deixá-los agora. – Ele falou. – Tenho uma guerra para lutar.

Ele começou a brilhar. Eu me afastei e puxei Annabeth, porque ela ainda estava congelada de choque.

Boa sorte Percy Martha a serpente sussurrou.

Hermes brilhou como a luz de uma supernova. Então ele desapareceu.



Annabeth sentou-se aos pés do trono da sua mãe e chorou. Eu queria confortá-la, mas eu não sabia como.

– Annabeth – eu disse – não é sua culpa. Eu nunca tinha visto Hermes agir dessa forma. Eu acho ... Eu não sei ... provavelmente se sente culpado por Luke. Ele está procurando alguém para culpar. Não sei por que ele atacou você. Você não fez nada para merecer isso.

Annabeth limpou os olhos. Ela fixou seu olhar na lareira como se fosse sua pira funerária. Eu falei meio constrangido.

– Hum, você não fez, certo?

Ela não respondeu. A faca de bronze celestial presa ao seu braço era a mesma de minha visão. Todos esses anos, eu não percebi que foi um presente de Luke. Eu perguntei a ela muitas vezes porque preferiu lutar com uma faca, em vez de uma espada, e ela nunca me respondeu.

Agora eu sabia.

– Percy – disse ela. – O que você quis dizer sobre a mãe de Luke? Você a conheceu?

Eu assenti com relutância.

– Nico e eu visitamos ela. Ela era um pouco... diferente.

Descrevi May Castellan, e no momento estranho em que seus olhos começaram a brilhar e ela falou sobre o destino de seu filho.

Annabeth amarrou a cara.

– Isso não faz sentido. Mas por que razão foram visitá-la... – Os olhos dela se arregalaram – Hermes disse que você carrega a maldição de Aquiles. Héstia disse a mesma coisa. Você... você se banhou no rio Estige?

– Não mude de assunto.

– Percy, sim ou não?

– Hum... talvez um pouco.

Contei a história de Hades e Nico, e como eu derrotei um exército dos mortos. Pulei a parte da visão dela puxando-me para fora do rio. Eu ainda não entendia muito bem esta parte, e só de pensar nisso, deixava envergonhado.

Ela balançou sua cabeça em descrença.

– Você tem alguma ideia de como isso foi perigoso?

– Eu não tive escolha – disse. – É a única maneira de eu me igualar a Luke.

– Você quer dizer... di immortales é claro! É por isso que o Luke não morreu. Ele foi para o Estige e... Oh não, Luke. O que ele estava pensando?

– Então agora você está preocupado com Luke de novo. – Eu protestei.

Ela olhou mim e eu apenas me afastei.

– O quê?

– Esqueça... – eu murmurei.

Apenas gostaria de saber, o que significava aquilo que Hermes tinha dito sobre ela não ter salvado Luke, quando teve chance. Claramente, ela não havia me contado tudo. Mas no momento eu não estava com vontade de perguntar. A última coisa que eu queria saber era mais alguma coisa sobre a sua história e de Luke.

– O ponto é, ele não morreu no Estige – eu disse. – E nem eu. Agora eu tenho que enfrentá-lo. Temos de defender Olimpo.

Annabeth estava estudando minha cara, como se estivesse tentando ver alguma mudança desde o meu mergulho no Estige.

– Eu acho que você está certo. Minha mãe falou...

– Plano vinte e três.

Ela mexeu na mochila e puxou o laptop de Dédalo. O símbolo Delta em azul brilhava na tela, enquanto ele ligava. Ela abriu alguns arquivos e começou a ler.

– Aqui está – disse ela. – Deuses, temos muito trabalho a fazer.

– Uma invenção de Dédalo?

– Um monte de invenções... perigosas. Se a minha mãe quer que eu use este plano, ela deve achar que as coisas estão muito ruins.

Ela olhou pra mim.

– Sobre a mensagem para você: Lembre-se dos rios. O que será que significa?

Eu balancei minha cabeça. Como de costume, não tinha nenhuma ideia que os deuses estavam me dizendo. Qual rio eu deveria me lembrar? Do Estige? Do Mississipi?

Então os irmãos Stoll entraram correndo na sala do trono.

– Você precisa ver isto – disse Connor. – Agora.



As luzes azuis no céu tinham parado, de início eu não entendia qual era o problema. Os outros campistas se reuniram em um pequeno parque na borda da montanha. Eles estavam enfileirados em um parapeito, olhando para baixo em Manhattan. Alinhados ao parapeito havia vários binóculos, onde se depositava um Dracma de ouro para enxergar toda a cidade.

Todos os binóculos estavam ocupados. Eu olhei para baixo na cidade. Eu podia ver quase tudo a partir daqui, os rios East e Hudson esculpindo a forma de Manhattam, a linha das ruas, as luzes dos arranha-céus, o trecho escuro do Central Park, no norte.

Tudo parecia normal, mas algo estava errado. Sentia em meus ossos antes de perceber o que era.

– Eu não... ouço nada – Annabeth disse.

Esse era o problema.

Ainda nesta altura, nos deveríamos estar ouvindo o barulho de milhões de pessoas se movimentando pela cidade, milhares de veículos e máquinas, o zumbido que faria uma grande metrópole.

Você não pensa nisso quando mora em Nova York, mas está sempre lá. Mesmo na calada da noite, Nova York nunca é silenciosa. Mas agora estava. Senti como se o meu melhor amigo tivesse subitamente caído morto.

– O que foi que fizeram? – Minha voz soou angustiada e com muita raiva. – O que fizeram com a minha cidade?

Eu empurrei Michael Yew para o lado e peguei o binóculo para dar uma olhada. Nas ruas abaixo, o tráfego tinha parado. Os pedestres estavam deitados sobre as calçadas, ou agachados perto das portas. Não havia nenhum sinal de violência, nada destruído, nada disso. Era como se todas as pessoas em Nova York, tinham simplesmente decidido parar o que eles estavam fazendo e desmaiar.

– Eles estão mortos? – Silena perguntou com espanto.

Meu estômago gelou. Uma linha da profecia tocou meus ouvidos: Num sono sem fim o mundo estará. Lembrei-me da história de Grover, sobre o encontro com Morfeu, o Deus do sono, no Central Park. Você tem sorte, estou guardando minhas energias para o evento principal.

– Morto não – eu disse. – Morfeu pôs toda a ilha de Manhattam para dormir. A invasão começou.   

Nenhum comentário:

Postar um comentário