sábado, 31 de agosto de 2013

O ultimo olimpiano - capitulo 10




                                Compro alguns amigos novos


Senhora O’Leary era a única feliz com a cidade toda adormecida.

Nós a encontramos farejando uma carrocinha de cachorro quente, enquanto o dono estava deitado na calçada, chupando seu dedo.

Argos estava nos esperando com suas centenas de olhos bem abertos. Ele não disse nada. Ele nunca dizia. Acho que é porque ele tem, segundo se supõe, um globo ocular na língua. Mas seu rosto deixava claro que ele estava surtando.

Eu lhe contei o que soubéramos no Olimpo, e que os deuses não viriam para nos auxiliar. Argos rolou seus olhos com desgosto, o que pareceu muito psicodélico, uma vez que todo seu corpo rolou.

– É melhor você voltar ao acampamento – eu disse a ele. – Proteja-o da melhor forma que puder.

Ele apontou para mim e ergueu as sobrancelhas, inquirindor.

– Eu vou ficar bem – eu disse.

Argos concordou, como se essa resposta o satisfizesse. Ele olhou para Annabeth e fez um círculo no ar com seu dedo.

– Sim – Annabeth concordou. – Acho que está na hora.

– Hora de quê? – Eu perguntei.

Argos vasculhou a traseira de sua van. Ele tirou um escudo de bronze e o entregou a Annabeth. Ele parecia um escudo normal – daqueles que usamos para a captura da bandeira. Mas quando Annabeth o colocou no chão, o reflexo no metal polido mudou do céu e dos edifícios para a Estátua da Liberdade – que não estava nem um pouco perto de nós.

– Uau – Eu disse. – Um escudo vídeo.

– Uma das ideias de Dédalo. – Annabeth disse. – Pedi a Beckendorf que fizesse antes que... – Ela olhou para Silena. – Hum, de qualquer forma, o escudo muda de acordo com a luz do dia ou a luz da lua de qualquer lugar do mundo para criar um reflexo. Você pode ver qualquer alvo tanto sobre o sol ou a lua, contanto que uma luz natural esteja o tocando. Olhe.

Nós nos aproximamos enquanto Annabeth se concentrava. De primeiro as imagens mexiam-se, então eu fiquei um pouco enjoado só de ver. Estávamos no zoológico do Central Park, em seguida correndo pela Rua 60 Leste, passando pela Bloomingdale’s, dobrando então na Terceira Avenida.

– Puxa – Connor Stoll disse. – Volte. Dê um zoom bem ali.

– O quê? – Annabeth disse nervosamente. – Você viu invasores?

– Não, bem ali, no Dylan’s Candy Bar. – Connor sorriu para seu irmão. – Cara, está aberta. E todos estão dormindo. Você está pensando no que eu estou pensando?

– Connor! – Katie Gardner o repreendeu. Ela pareceu sua mãe, Deméter. – Isso é sério. Você não vai assaltar uma loja de doces no meio de uma guerra!

– Desculpa – Connor murmurou, mas não parecia muito envergonhado.

Annabeth passou sua mão na frente do escudo, e outra cena apareceu: FDR Drive, dando vista para o outro lado do rio, o Lighthouse Park.

– Isso nos mostrará a cidade inteira. – Ela disse. – Obrigado Argos. Espero poder te ver novamente no acampamento... Algum dia.

Argos grunhiu. Ele me deu uma olhada que obviamente significava Boa sorte, pois precisará dela, então ele entrou na van. Ele e as duas harpias motoristas deram a volta, costurando entre grupos de carros que enchiam a rua. Eu assoviei para Senhora O’Leary, e ela veio pulando.

– Ei garota! – Eu disse. – Você se lembra do Grover? O sátiro que nos achou no parque?

“WOOF!”

Esperei que isso significasse Claro que lembro! E não, Você tem mais cachorros quentes?

– Eu preciso de você para encontrá-lo – eu disse. – Certifique-se que ainda estará acordado. Vamos precisar da ajuda dele. Entendeu? Encontre Grover!

Senhora O’Leary me deu um beijo lambuzado, que parecia desnecessário. Ela correu para o norte.

Pólux agachou-se perto de um oficial de polícia adormecido.

– Eu não entendo. Por que não dormimos também? Por que só os mortais?

– Esse é um ataque muito grande – Silena Beauregard disse. – Quanto maior for o ataque, mais fácil é de se resistir. Se você quiser fazer milhões de mortais dormirem, você tem que arremessar uma camada muito fina de mágica. Mas com os semideuses é bem mais difícil.

Eu olhei para ela.

– Quando que você aprendeu tanto de mágica?

Silena ficou vermelha.

– Eu não passo o tempo todo no meu vestiário.

– Percy – Annabeth chamou. Ela ainda estava olhando para o escudo. – Seria bom você ver isso.

A imagem no bronze mostrava o Estreito de Long Island, perto de La Guardia. Uma frota de doze atravessava velozmente as águas escuras em direção à Manhattan. Cada barco lotado de semideuses em armaduras completas. Na popa do barco líder, uma bandeira púrpura adornada com uma foice negra se agitava ao vento noturno. Eu nunca tinha visto aquela bandeira antes, mas não era difícil deduzir: a bandeira de batalha de Cronos.

– Examine o perímetro da ilha – eu disse. – Rápido.

Annabeth mudou a cena para o porto ao sul. Uma barca de Staten Island sulcava as ondas perto de Ellis Island. O convés estava cheio de dracaenae e um bando de cães infernais. Nadando na frente do barco, havia um monte de mamíferos marinhos. De primeira, pensei que eles fossem golfinhos. Depois eu vi seus rostos de cachorro e espadas presas à suas cinturas, então percebi que eles eram telquines – demônios do mar.

A cena mudou de novo: o litoral de Jersey, bem na entrada do Túnel Lincoln. Centenas de monstros diferentes estavam marchando pelas ruas do tráfego parado: gigantes com seus bastões, ciclopes malfeitores, alguns dragões cuspidores de fogo, e para completar, um tanque Sherman da Segunda Guerra Mundial, empurrando os carros para fora do caminho à medida que ribombava entrando no túnel.

– O que esta acontecendo com os mortais lá fora? – Eu disse. – O estado inteiro está adormecido?

Annabeth franziu a sobrancelha.

– Não creio, mas é estranho. O máximo que posso dizer sobre essas imagens, é que Manhattan inteira está adormecida. E em um raio de oitenta quilômetros ao redor da ilha, o tempo está passando muito, muito devagar. Quanto mais você se aproxima de Manhattan, mas lento ele fica.

Ela me mostrou outra cena – uma estrada de New Jersey. Era sábado à noite, então o tráfego não estava tão ruim como ele costuma estar nos dias úteis. Os motoristas pareciam acordados, mas os veículos se moviam a menos de dois quilômetros por hora. Pássaros voavam acima deles em câmera lenta.

– Cronos – eu disse. – Ele está retardando o tempo.

– Hécate deve estar ajudando. – Katie Gardner disse. – Olhe como os carros estão se afastando das saídas, como se eles estivessem recebendo uma mensagem subliminar para retornar.

– Eu não sei. – Annabeth parecia muito frustrada. Ela odiava não saber. – Mas de algum jeito eles cercaram Manhattan com um véu mágico. O mundo lá fora nem deve imaginar que tem algo de errado. Qualquer mortal que viesse para Manhattan ia ficar tão devagar que eles não saberiam o que estaria acontecendo.

– Como moscas no âmbar – Jake Mason murmurou.

Annabeth concordou.

– Não deveríamos esperar nenhuma ajuda a caminho.

Eu me virei para meus amigos. Eles pareciam petrificados e horrorizados, e eu não podia culpá-los. O escudo tinha nos mostrado pelo menos trezentos inimigos a caminho. E havia quarenta de nós. E estávamos sozinhos.

– Tudo bem – eu disse. – Iremos proteger Manhattan.

Silena mexeu em sua armadura.

– Hum, Percy, Manhattan é enorme.

– Nós iremos protegê-la. – Eu disse. – Temos que protegê-la.

– Ele está certo – Annabeth disse. – Os deuses do vento devem manter as tropas de Cronos longe do Olimpo pelo ar, então ele tentará uma invasão por solo. Temos que cercar as entradas para a ilha.

– Eles têm barcos – Michael Yew lembrou.

Um formigamento elétrico passou por minhas costas. De repente eu me lembrei do conselho de Atena: Lembre-se dos rios.

– Eu cuido dos barcos – eu disse.

Michael franziu as sobrancelhas.

– Como?

– Só deixe comigo – respondi. – Precisamos cercar as pontes e os túneis. Vamos supor que eles tentem invadir o centro primeiro, pelo menos como sua primeira tentativa. Seria o melhor caminho para o Edifício Empire State. Michael, leve o chalé de Apolo para a Ponte de Williamsburg. Katie, leve os do chalé de Deméter para o Túnel do Brooklyn-Battery. Plante arbustos de espinhos e envenene o túnel. Faça o que tiverem que fazer, mas os mantenham longe de lá. Connor, leve a metade do chalé de Hermes e proteja a Ponte do Brooklyn. E nada de parar para roubar ou saquear!

– Ahhhh! – O chalé todo de Hermes reclamou.

– Silena, leve o chalé de Afrodite para o Queens - o Metrô.

– Ah meus deuses – uma das irmãs disse. – A Quinta Avenida está bem no nosso caminho! Poderíamos nos equipar e, bem, os monstros certamente detestam Givenchy.

– Nada de atrasos – disse eu. – E... sobre o negócio do perfume, se vocês acham que vai funcionar...

Seis filhas de Afrodite me beijaram na bochecha de entusiasmo.

– Ok, chega! – Eu fechei meus olhos, tentando me lembrar do que eu tinha esquecido. – O Túnel Holland. Jake, leve o chalé de Hefesto pra lá. Use fogo grego, monte armadilhas. Tudo o que você puder.

O chalé inteiro grunhiu em aprovação.

– A ponte da rua 59 – eu disse. – Clarisse...

Gaguejei. Clarisse não estava aqui. O chalé inteiro de Ares, malditos sejam, estava à toa no acampamento.

– Nós assumimos esta – interveio Annabeth, poupando-me de um silêncio constrangedor. Ela virou-se para seus irmãos. – Malcolm, leve o chalé de Atena, ative o plano vinte e três durante o caminho, exatamente como lhe mostrei. Mantenha posição.

– Você que manda.

– Eu irei com Percy – ela disse. – Depois eu me junto com vocês, ou iremos onde precisarem de nós.

Alguém no fundo do grupo disse.

– Sem desvios, vocês dois.

Havia alguns risinhos, mas eu resolvi deixar essa passar.

– Tudo bem – eu disse. – Mantenham-se com seus celulares.

– Não temos celulares – Silena protestou.

Eu me abaixei, peguei um BlackBerry feminino e entreguei a Silena.

– Você tem agora. Todos vocês sabem o número de Annabeth, né? Se vocês precisarem de nós, peguem um celular e nos ligue. Use-o uma vez, jogue-os fora, e pegue um emprestado se for necessário. Isso deverá dificultar os monstros de pegar um de vocês.

Todos riram, como se essa ideia lhes agradasse.

Travis limpou sua garganta.

– Hum, se encontrarmos um celular muito legal...

– Não, você não pode pegá-lo. – Eu disse.

– Ah, cara.

– Calma Percy – Jake Mason disse. – Você esqueceu do Túnel Lincoln.

Engoli um palavrão. Ele estava certo. Um tanque Sherman e centenas de monstros estavam marchando por esse túnel neste exato momento, e eu concentrei nossa força toda em qualquer outro lugar.

Então a voz de uma garota chamou do outro lado da rua:

– Que tal deixar esse conosco?

Eu nunca fiquei tão feliz por ouvir alguém em toda minha vida. Um bando de garotas adolescentes cruzava a Quinta Avenida. Elas estavam vestindo camisas brancas, calças cinza camufladas, e botas de luta. Todas tinham espadas ao lado do corpo, e arcos nas costas, com flechas preparadas. Uma alcateia de lobos brancos rodeava seus pés, e muitas das garotas tinham falcões caçadores em seus braços.

A garota na liderança tinha cabelos espetados pretos e uma jaqueta de couro preta. Ela tinha um arco prateado na cabeça, como se fosse uma tiara de princesa, o que não combinou com seus brincos de caveira ou sua camisa Morte à Barbie mostrando uma pequena boneca da Barbie com uma flecha na sua cabeça.

– Thalia! – gritou Annabeth.

A filha de Zeus sorriu. 

– As caçadoras de Ártemis, apresentando-se ao trabalho!



Havia abraços e cumprimentos por todos os lados... Ou pelo menos Thalia era amigável. As outras caçadoras não gostavam de estar perto de campistas, especialmente os garotos, mas elas não atiraram em nenhum de nós, o que pra elas já era uma grande saudação de boas-vindas.

– Por onde você andou no último ano? – Eu perguntei a Thalia. – Você parece duas vezes mais com as Caçadoras agora!

Ela riu.

– É uma história muito longa. Eu aposto que minhas aventuras foram mais perigosas do que as suas, Jackson.

– Duvido – felei.

– Veremos – ela me garantiu. – Depois que isso acabar, você, Annabeth e eu: cheeseburgers e fritas no hotel na 57 Oeste.

– Le Parker Meridien – eu disse. – Combinado. E, Thalia, obrigado.

Ela deu de ombros.

– Esses monstros nem vão saber o que os atingiu. Caçadoras, andando!

Ela tocou no seu bracelete de prata e seu escudo Aegis abriu-se na forma completa. A cabeça da Medusa de ouro no centro era tão horrível, que todos os campistas se afastaram. As Caçadoras desceram a avenida, seguidas por seus lobos e falcões, e eu tinha a sensação que o Túnel Lincoln estava a salvo por enquanto.

– Graças aos deuses – Annabeth disse. – Mas se não conseguirmos bloquear os rios destes barcos, os guardas das pontes e túneis serão inúteis.

– Você tem razão – eu disse.

Olhei para os campistas, todos estavam sorrindo e determinados. Eu tentei não me sentir como se essa fosse a última vez que eu os fosse ver todos juntos.

– Vocês são os maiores heróis do milênio. – Eu disse a eles. – Não importa quantos monstros venham até você. Lutem bravamente, e venceremos. – Ergui Contracorrente e gritei: PELO OLIMPO!

Eles gritaram em resposta, e nossas quarenta vozes ecoaram pelos prédios do Centro. Por um momento soou como bravura, mas rapidamente sumiu no silêncio de dez milhões de pessoas em Nova York.



Annabeth e eu não teríamos escolhido um carro, mas eles estavam todos presos, com os para-choques quase colados. Nenhum motor estava ligado, o que era estranho. Era como se os motoristas tivessem tido tempo de desligar a ignição antes de eles pegarem no sono. Ou talvez Morfeu tivesse o poder de pôr as ignições para dormir também. A maioria dos motoristas aparentemente havia tentado parar junto ao meio-fio ao sentir que estava apagando, mas, ainda assim, as ruas encontravam-se atravancadas demais para que um carro conseguisse passar por elas.

Finalmente encontramos um carteiro encostado em um muro, ainda montado em sua Vespa vermelha. Nós o tiramos da motocicleta e o colocamos na calçada.

– Foi mal, cara – eu disse. Com alguma sorte eu traria a moto dele de volta. E se eu não conseguisse, isso não importaria muito, pois a cidade já estaria destruída.

Eu dirigi com Annabeth atrás de mim, segurando-me pela cintura. Nós ziguezagueamos pela Broadway com o motor zumbindo no silêncio sinistro. Os únicos sons eram os celulares tocando de vez enquanto – como se eles tivessem chamando um ao outro, como se Nova York fosse um viveiro eletrônico.

Nosso progresso estava devagar. Frequentemente passávamos por pedestres que tinham adormecido na frente de um veículo, e os removíamos por precaução. Uma vez nós paramos para apagar o cartaz de uma loja de rosquinhas que tinha pegado fogo. Poucos minutos depois, tivemos que resgatar um carrinho de bebê que estava descendo rua abaixo sem controle. Então vimos que não tinha nenhum bebê dentro – só o poodle de alguém. Vá entender. Nós o prendemos seguramente numa porta e continuamos a correr com a moto.

Estávamos passando pelo Madison Square Park quando Annabeth disse:

– Encoste.

Eu parei no meio da 23 Leste. Annabeth pulou e correu para o parque. Quando eu a alcancei, ela estava olhando uma estátua de bronze em um pedestal de mármore vermelho. Eu passei por aqui umas mil vezes e nunca tinha notado.

O cara estava sentado numa cadeira com suas pernas cruzadas. Ele vestia um terno antigo – Estilo de Abraham Lincoln – com uma gravata borboleta, um paletó e essas coisas. Um monte de livros estava entulhado embaixo de sua cadeira. Ele segurava uma pena de escrita em uma mão e uma chapa de metal com pergaminhos na outra.

– Que importância tem esse... – Eu apertei os olhos para ver o nome no pedestal. – William H. Steward?

– Seward – Annabeth corrigiu. – Ele foi um governador de Nova York. Um semideus insignificante – filho de Hebe, eu acho. Mas isso não é importante. A estátua que importa.

Ela subiu no banco do parque e examinou a base da estátua.

– Não me diga que é um autômato – eu disse.

Annabeth sorriu.

– A maioria das estátuas da cidade são autômatos. Dédalo os plantou aqui, no caso dele precisar de um exército.

– Para atacar o Olimpo ou defendê-lo?

Annabeth franziu a testa.

– Ambos. Esse era o plano vinte e três. Ele poderia ativar uma estátua e todas as estátuas da cidade seriam ativadas, até formar-se um exército. Embora seja perigoso. Você sabe o quão imprevisíveis os autômatos são.

– Aham. – Eu disse. Nós tivemos nossa parte de más experiências com eles.

– Você realmente está pensando em ativá-los?

– Eu tenho as anotações de Dédalo – ela disse. – Eu acho que posso... Ah, vamos lá.

Ela pressionou a ponta da bota de Seward e a estátua levantou-se, com a pena e o papel em punho.

– O que ele vai fazer? – Eu murmurei. – Um memorando?

– Psiu – replicou Annabeth. – Olá, William.

– Bill – eu sugeri.

– Bill... Ah cale a boca – Annabeth me disse. A estátua inclinou sua cabeça, olhando para nós com olhos de metal azuis.

Annabeth limpou sua garganta.

– Olá, hã, Governador Seward. Sequencia de comando: Dédalo Vinte Três. Defender Manhattan. Começar ativação.

Seward pulou de seu pedestal. Ele caiu tão forte no chão, que seus sapatos racharam a calçada. Depois ele saiu correndo para o oeste.

– Ele provavelmente vai acordar Confúcio – Annabeth supôs.

– O quê? – Eu disse.

– Outra estátua, na Division. O negócio é que eles continuarão acordando um ao outro até todos estiverem ativados.

– E depois?

– Espero que eles defendam Manhattan.

– Eles sabem que nós não somos os inimigos?

– Eu acho que sim.

– Isso é bem animador. – Pensei em todas as estátuas de bronze nos parques, praças, e prédios de Nova York. Devia ter centenas, talvez milhares.

Então uma bola de um brilho verde explodiu no céu da noite. Fogo grego, em algum lugar no Rio East.

– Precisamos nos apressar – falei. E corremos para a Vespa.



Estacionamos do lado de fora do Battery Park, na parte mais baixa de Manhattan onde os rios Hudson e East se juntam e deságuam na baía.

– Espere aqui – eu disse a Annabeth.

– Percy, você não deveria ir sozinho.

– Bem, a menos que você respire debaixo d’água...

Ela suspirou.

– Às vezes você é tão irritante...

– Como quando tenho razão? Acredite em mim, eu ficarei bem. Eu tenho a maldição de Aquiles agora. Sou invencível.

Annabeth não pareceu convencida.

– Só cuide-se. Não quero que nada aconteça com você. Digo, por que precisamos de você para batalha.

Eu sorri.

– Volto em um instante.

Desci até a margem e entrei na água.

Para você aí que não tem nenhum parentesco com os deuses da água: não saiam nadando pelo Porto de Nova York. Ele não era tão imundo na época da minha mãe, mas aquela água provavelmente faria crescer um novo olho em você ou ter filhos mutantes quando crescer.

Eu mergulhei na escuridão, nadando para o fundo. Eu tentei achar o ponto em que as duas correntes dos rios pareciam iguais – onde eles se tocavam para formar a baía. Eu imaginei que essa era o melhor lugar para se conseguir a informação.

– EI! – gritei em minha melhor voz subaquática. O som ecoou na escuridão. – Eu ouvi dizer que vocês são tão poluídos que têm vergonha de mostrar suas caras. É verdade?

Uma corrente fria chegou pela baía, trazendo lixo e lodo.

– Eu ouvi que o Rio East é o mais tóxico – continuei – mas o Hudson cheira pior. Ou é ao contrário?

A água brilhou. Alguma coisa poderosa e irritada estava me observando agora. Eu podia sentir sua presença... Ou talvez duas presenças.

Temi ter exagerado nos insultos. E se eles simplesmente acabassem comigo sem se mostrar? Mas aqueles eram os deuses dos rios de Nova York. Calculei que seu instinto seria me confrontar.

De fato, duas formas gigantes apareceram na minha frente. De primeira eles eram como colunas de lodo de um marrom escuro, mais densa do que a água ao seu redor. Então apareceram pernas, braços e rostos de expressão colérica.

A criatura da esquerda parecia assustadoramente um telquine. Suas feições eram lupinas. Seu corpo lembrava vagamente um foca – pele lisa preta, com pés e mãos de nadadeiras. Seus olhos brilhavam com um verde radiante.

O cara na direita era mais humano. Ele estava vestido com trapos e alas marinhas, com um casaco feito de garrafas com tampinhas e velhos plásticos de engradados. Seu rosto estava manchado com algas, e sua barba enorme. Seus olhos azuis profundos queimavam em raiva.

A foca, que tinha que ser o deus do Rio East, disse:

– Você está tentando morrer, criança? Ou você só é muito burro?

O espírito barbudo do Hudson debochou.

– Você é o especialista em estupidez, East.

– Cuidado, Hudson. – East grunhiu. – Fique do seu lado da ilha e se preocupe com seus negócios.

– Ou o quê? Você vai jogar outro balde de lixo em cima de mim?

Eles flutuavam rodeando-os, prontos para lutar.

– Calma aí! – Eu gritei. – Nós temos um problema maior.

– A criança está certa – East ganiu. – Vamos matá-lo juntos, depois nós lutamos entre a gente.

– Gostei da ideia – Hudson disse.

Antes que eu pudesse protestar, milhares de pedaços de lixo surgiram do fundo e vieram direto a mim de ambas as direções: vidros quebrados, pedras, latas, pneus.

Eu esperava por isso mesmo. A água em minha frente se espessou, formando um grande escudo. O lixo batia nele, inofensivamente. Só um pedaço entrou: um grande pedaço de vidro que atingiu meu peito e provavelmente teria me matado, mas ele se despedaçou em minha pele.

Os dois deuses do rio olharam para mim.

– Filho de Poseidon? – perguntou East.

Eu concordei.

– Tomou um banho no Estige? – Hudson perguntou.

– Sim.

Ambos fizeram sons de desgosto.

– Perfeito – East disse. – Agora como o matamos?

– Nós poderíamos eletrocutá-lo – Hudson respondeu. – Se pelo menos pudéssemos encontrar uns cabos...

– Escutem-me! – Eu disse. – O exército de Cronos está invadindo Manhattan!

– E você acha que já não sabemos disso? – East perguntou. – Eu posso sentir seus barcos agora mesmo. Eles estão quase terminando a travessia.

– Sim – Hudson concordou. – Tem uns monstros esquisitos cruzando as minhas águas também.

– Então os pare – falei. – Afunde-os. Afunde seus barcos.

– Por que deveríamos? – Hudson grunhiu. – Eles que invadam o Olimpo. Por que nos importaríamos?

– Pois eu posso pagar vocês. – Eu peguei o dólar de areia que meu pai tinha me dado de aniversário.

Os olhos dos deuses arregalaram-se.

– É meu! – East disse. – Dê isso pra mim, criança, e eu prometo que nenhuma das escórias de Cronos atravessará o meu rio.

– Esqueça isso – Hudson disse. – O dólar de areia é meu, ao menos que você queira que eu deixe todos esses navios atravessarem o meu rio.

– Vamos chegar a um acordo – eu dividi o dólar em dois. Uma onda de água limpa saiu do dólar, como se toda poluição tivesse se dissolvido. – Cada um fica com a metade – disse eu – em troca, vocês mantém todas as tropas de Cronos longe de Manhattan.

– Ah cara – Hudson choramingou, tentando pegar o dólar de areia. – Faz tanto tempo desde a última vez em que eu estive limpo.

– O poder de Poseidon – murmurou o Rio East – ele é um idiota, mas sabe como varrer a poluição.

Eles olharam um pro outro e depois falaram juntos:

– Negócio fechado.

Eu dei para cada um a metade do dólar, o qual eles seguraram reverenciosamente.

– Hã... os invasores? – lembrei.

East fez um gesto rápido com a mão.

– Acabaram de afundar.

Hudson estalou seus dedos.

– Um bando de cães infernais acaba de dar um mergulho.

– Obrigado – eu disse. – Fiquem limpos.

Enquanto eu subia para superfície, East gritou:

– Ei criança, sempre que você tiver um dólar de areia pra gastar, volte. Se você estiver vivo.

– Maldição de Aquiles – bufou Hudson – eles sempre acham que isso vai salvá-los, não é?

– Se ele soubesse... – East concordou.

Os dois riram, dissolvendo-se na água.



De volta à superfície, Annabeth estava falando em seu telefone, mas ela desligou assim que me viu. Ela parecia muito abalada.

– Funcionou – eu disse a ela. – Os rios estão salvos.

– Bom – ela disse. – Por que temos outros problemas. Michael Yew acabou de ligar. Outra tropa esta marchando pela ponte de Williamsburg. O chalé de Apolo precisa de ajuda. E Percy, o monstro que está liderando os inimigos... É o Minotauro.

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