quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Capitulo XL - Percy






ELES ANDARAM PELA TERRA POR aproximadamente uma hora, mantendo os trilhos do trem à vista, mas cobertos pelas árvores tanto quanto possível. Por um momento, eles escutaram um helicóptero voando na direção dos destroços do trem. Duas vezes escutaram o grito dos grifos, mas eles soavam muito longe.
Pelo que Percy pôde deduzir, era quase meia-noite quando o sol finalmente se pôs. Ficou frio no bosque. As estrelas estavam brilhantes, ele estava tentado a parar e ficar admirando. Depois as luzes do norte fizeram uma curva. Elas fizeram Percy se lembrar do fogão a gás de sua mãe, quando ela mantinha as chamas em temperatura baixa – chamas azuis fantasmagóricas dançando de baixo para cima.
— Isso é incrível — Frank comentou.
— Ursos — Hazel apontou.
Com certeza, um casal de ursos marrons estava derrubando árvores a algumas centenas de metros dali, suas peles brilhando na luz das estrelas.
— Eles não vão nos incomodar — Hazel prometeu. — Apenas passem longe deles.
Percy e Frank não argumentaram.
Enquanto marchavam, Percy pensou sobre todos os locais malucos que ele já vira. Nenhum deles o deixou sem palavras como o Alasca. Ele podia ver por que ali era uma terra além dos deuses. Tudo era bruto e indomado. Não havia regras, nenhuma profecia, nenhum destino – apenas duros desertos e um bando de animais e monstros. Mortais e semideuses vinham aqui por sua própria conta e risco.
Percy pensou se isso era o que Gaia queria – que o mundo todo fosse assim. Pensou se seria assim uma coisa tão ruim. Mas depois deixou a ideia de lado. Gaia não era uma deusa gentil. Ouvira o que ela planejava fazer. Ela não era como a Mãe-Terra que você deve ter lido em um conto de fadas infantil. Era vingativa e violenta. Se algum dia acordasse completamente, destruiria a civilização humana.
Depois de algumas horas, eles se depararam com uma pequena vila entre os trilhos de trem e uma rodovia de mão dupla. A placa de limite da cidade dizia: PASSAGEM DE ALCES. Parado perto da placa estava um alce de verdade. Por um segundo, Percy pensou que ele poderia ser alguma espécie de estátua. Então o animal foi para dentro do bosque.
Eles passaram por algumas casas, um correio e alguns trailers. Tudo estava escuro e fechado.
Do outro lado da cidade tinha uma loja com uma mesa de piquenique e uma bomba de gasolina velha e enferrujada na frente. A loja tinha um letreiro feito à mão que dizia: GASOLINA DA PASSAGEM DE ALCES.
— Isso está errado — Frank disse.
Em um acordo silencioso eles se sentaram em volta da mesa de piquenique.
Os pés de Percy pareciam como blocos de gelo – blocos de gelo doloridos. Hazel apoiou a cabeça nas mãos e desmaiou, roncando. Frank tomou os seus últimos refrigerantes e algumas barras de cereal da viagem de trem e as dividiu com Percy.
Eles comeram em silêncio, olhando as estrelas, até que Frank disse:
— Você realmente quis dizer o que disse antes?
Percy olhou para o outro lado da mesa.
— Sobre o quê?
Sob a luz das estrelas, o rosto de Frank poderia ser um alabastro, como uma estátua romana velha.
— Sobre... estar orgulhoso de sermos parentes.
Percy bateu a sua barra de cereal na mesa.
— Bem, vamos ver. Você sozinho pegou três basiliscos enquanto eu estava tomando chá verde e gérmen de trigo. Segurou um exército de lestrigões para que o nosso avião pudesse levantar voo de Vancouver. Salvou a minha vida ao acertar aquele grifo. E desistiu da última carga da sua lança mágica para poder ajudar alguns mortais indefesos. Você é o filho mais legal do deus da guerra que eu já conheci... talvez o único legal. Então, o que acha?
Frank olhou para as luzes do norte, ainda cozinhando as estrelas em fogo baixo.
— É só que... eu deveria ser o responsável por esta missão, o centurião e tudo mais. Eu sinto como se vocês tivessem que me carregar.
— Não é verdade.
— Eu supostamente tenho esses poderes que não descobri como usar — Frank disse amargamente. — Agora não tenho uma lança, e estou quase sem flechas. E... estou assustado.
— Eu estaria preocupado se você não estivesse assustado — Percy replicou. — Todos nós estamos.
— Mas a Festa da Fortuna é... — Frank pensou sobre isso. — Já é depois da meia-noite, não é? Isso significa que é vinte e quatro de julho agora. A festa começa hoje ao anoitecer. Nós precisamos achar o nosso caminho para a Geleira Hubbard, derrotar o gigante que não pode ser derrotado em sua terra natal e voltar para o Acampamento Júpiter antes que ele seja invadido – tudo em menos de dezoito horas.
— E quando libertarmos Tânatos — Percy disse — ele pode clamar a sua vida. E a de Hazel. Acredite em mim, eu estive pensando sobre isso.
Frank olhou para Hazel, ainda roncando de leve. O rosto dela estava enterrado embaixo de uma massa de cabelos marrons cacheados.
— Ela é a minha melhor amiga — Frank disse. — Eu perdi a minha mãe, minha avó... não posso perdê-la também.
Percy pensou sobre a sua vida antiga – sua mãe em Nova York, Acampamento Meio-Sangue, Annabeth. Ele perdera tudo isso por oito meses. Até mesmo agora, com a sua memória voltando... Ele nunca esteve tão longe de casa antes. Ele fora para o Mundo Inferior e voltara. Enfrentara a morte milhares de vezes. Mas sentado nessa mesa de piquenique, milhares de quilômetros longe, além do poder do Olimpo, nunca esteve tão sozinho – exceto por Hazel e Frank.
— Eu não vou perder nenhum de vocês — ele prometeu. — Eu não vou deixar que isso aconteça. E, Frank, você é um líder. Hazel diria a mesma coisa. Nós precisamos de você.
Frank abaixou a cabeça. Ele parecia perdido em pensamentos. Finalmente inclinou-se para frente até que sua cabeça se chocou contra a mesa de piquenique. Começou então a roncar em harmonia com Hazel.
Percy suspirou.
— Outro discurso inspirador de Jackson — ele disse para si mesmo. — Descanse Frank. Amanhã vai ser um grande dia.

Ao amanhecer, a loja abriu. O dono ficou um pouco surpreso de encontrar três adolescentes caídos sobre a mesa de piquenique, mas quando Percy explicou que eles tinham fugido do acidente de trem da noite passada, o cara sentiu pena e fez um café da manhã para eles. Chamou um amigo dele, um nativo que tinha uma cabine fechada para Seward. Logo eles já estavam na estrada em uma picape Ford que devia ser nova na época que Hazel nascera.
Hazel e Frank sentaram atrás. Percy ia na frente com o homem velho, que cheirava a salmão defumado. Ele contou à Percy a história sobre Bear e Raven, os Deuses Inuits e tudo o que Percy podia pensar era que ele esperava não conhecê-los. Ele já tinha inimigos o suficiente.
A caminhonete quebrou a alguns quilômetros de Seward. O motorista não pareceu surpreso, já que isso acontecia a ele várias vezes por dia. Ele disse que poderiam esperar até que concertasse o motor, mas como Seward era só há alguns quilômetros dali, os garotos decidiram ir andando.
No meio da manhã, eles escalaram uma elevação na estrada e viram uma pequena baía cercada de montanhas. A cidade era uma meia-lua na margem direita, com um cais se estendendo até a água e um navio de cruzeiro no porto.
Percy estremeceu. Tinha tido experiências ruins com cruzeiros.
— Seward — Hazel apresentou. Ela não soava feliz ao ver o seu antigo lar.
Eles já tinham perdido muito tempo, e Percy não estava gostando como o sol estava subindo rápido. A estrada dava a volta na encosta, mas parecia que eles chegariam mais rápido na cidade indo direto pelo pasto.
Percy foi para fora da estrada.
— Vamos.
O chão estava mole, mas ele não pensou muito sobre isso até que Hazel gritou:
— Percy, não!
O próximo passo dele foi direto para dentro do chão. Ele afundou como uma pedra até que a terra se fechou sobre a sua cabeça – e a terra o engoliu.

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