quinta-feira, 17 de outubro de 2013

XLII - Piper






ENCONTRAR O LUGAR FOI FÁCIL. Percy os levou diretamente a ele, em um trecho abandonado de encosta com vista para as ruínas do Fórum.
Entrar foi fácil também. A espada de ouro de Jason pôde cortar o cadeado e o portão de metal se abriu. Nenhum dos mortais viu. Nenhum alarme disparou. Degraus de pedra desciam em espirais para dentro do escuridão.
— Eu vou primeiro — disse Jason.
— Não! — Piper graniu.
Os dois garotos se viraram para ela.
— Pipes, o que é? — Jason perguntou. — Essa imagem na lâmina... Você já viu isso antes, não foi?
Ela assentiu com a cabeça, com os olhos lacrimejando.
— Eu não sei como lhe dizer. Eu vi a sala lá em baixo encher-se com água. Eu vi nós três nos afogando.
Tanto Jason quanto Percy franziram a testa.
— Eu não posso me afogar — Percy disse, embora soasse como se estivesse fazendo uma pergunta.
— Talvez o futuro tenha mudado — Jason especulou. — Na imagem que você acabou de nos mostrar, não havia água.
Piper desejou que ele estivesse certo, mas ela suspeitava que não teriam tanta sorte.
— Olha — Percy sugeriu. — Eu vou dar uma olhada primeiro. Está tudo bem. Volto já.
Antes que Piper pudesse protestar, ele desapareceu pela escada.
Ela contou em silêncio enquanto esperava pela sua volta. Quando estava em torno do número 35, ouviu seus passos e ele apareceu no topo, parecendo mais confuso do que aliviado.
— Boa notícia: sem água. Má notícia: não vejo nenhuma saída lá em baixo. E, uh, notícia estranha: bem, vocês deviam ver isso...
Desceram cautelosamente. Percy assumiu a liderança, com Contracorrente empunhada. Piper seguiu e Jason caminhou atrás dela, protegendo sua retaguarda. A escada parecia um saca-rolhas estreito de alvenaria, com no máximo seis metros de diâmetro. Mesmo que Percy tivesse informado que estava tudo limpo, Piper manteve os olhos abertos para armadilhas. A cada volta da escada ela esperava uma emboscada. Ela não tinha nenhuma arma, apenas a cornucópia em um cordão de couro por cima do ombro. Se as coisas ficassem feias, as espadas dos meninos não adiantariam muito em um espaço tão apertado.
Talvez Piper pudesse disparar em seus inimigos presuntos defumados em alta velocidade. Enquanto eles abriam seu caminho através do subterrâneo, Piper viu velhas pichações entalhadas nas pedras: números romanos, nomes e frases em italiano, o que significava que outras pessoas tinham estado aqui mais recentemente que o Império Romano, mas isso não tranquilizou Piper. Se existiam monstros aqui embaixo, eles ignorariam os mortais, esperando por alguns semideuses suculentos passar.
Finalmente, eles chegaram ao fundo.
Percy virou.
— Vejam este último pedaço.
Ele saltou para o chão da sala cilíndrica, que estava a cinco metros abaixo do fim da escada. Por que alguém iria projetar um conjunto de escadas como esse? Piper não tinha ideia. Talvez o quarto e a escada houvessem sido construídas durante diferentes períodos de tempo.
Ela queria virar e sair, mas não poderia fazer isso com Jason atrás dela e não podia deixar Percy lá. Ela foi para baixo e Jason a seguiu.
O cômodo era como ela tinha visto na lâmina da Katoptris, exceto que não havia água. As paredes curvas que antes tinham sido pintadas com afrescos agora estavam desbotadas como a casca de um ovo branco com apenas manchas da cor original. A abóbada estava a cerca de quinze metros acima.
Do outro lado da sala, opostas à escada, nove alcovas foram esculpidas na parede. Cada nicho tinha cerca de cinco metros à partir do chão e era grande o suficiente para uma estátua de tamanho humano, mas todas estavam vazias.
O ar estava frio e seco. Como Percy tinha dito, não havia outra saída.
— Tudo bem — Percy ergueu as sobrancelhas. — Aqui está a parte estranha. Vejam.
Ele deu um passo para o meio da sala.
Imediatamente, uma luz verde e azul ondulou através das paredes. Piper ouviu o som de uma fonte, mas não havia água. Não parecia haver nenhuma fonte de luz, exceto as lâminas de Percy e Jason.
— Vocês sentem o cheiro do oceano? — Percy perguntou.
Piper não tinha notado em primeiro lugar. Ela estava de pé ao lado de Percy e ele sempre cheirava a mar. Mas ele estava certo. O cheiro de água salgada e tempestade estava ficando mais forte, como um furacão de verão se aproximando.
— Uma ilusão? — ela perguntou. De repente, ela se sentiu estranhamente sedenta.
— Eu não sei — Percy respondeu. — Sinto que deveria existir água aqui, muita água. Mas não há nada. Eu nunca estive em um lugar como este.
Jason caminhou para a linha de nichos. Ele tocou a prateleira inferior do mais próximo, que estava ao nível dos olhos.
— Esta pedra... É incrustada com conchas. Isto é um nymphaeum.
A boca de Piper estava definitivamente ficando mais seca.
— Uma o quê?
— Nós temos um no Acampamento Júpiter — Jason disse — em Temple Hill. É um santuário para as ninfas.
Piper passou a mão ao longo da parte inferior de outro nicho. Jason estava certo. A alcova estava cravejada com caracóis, conchas e moluscos. As conchas do mar pareciam dançar na luz aquosa. Eram geladas ao toque.
Piper sempre tinha pensado em ninfas como espíritos amigáveis – bobas e namoradeiras, geralmente inofensivas. Elas se davam bem com os filhos de Afrodite. Amavam compartilhar fofocas e dicas de beleza. Este lugar, no entanto, não parecia a parte de trás do lago de canoagem no Acampamento Meio-Sangue ou os córregos na mata onde Piper normalmente encontrava ninfas. Este lugar parecia não natural, hostil e muito seco.
Jason recuou e examinou a fileira de alcovas.
— Santuários como este estavam em todo o lugar na Roma Antiga. As pessoas ricas ficavam do lado de fora de suas casas para homenagear ninfas para certificar-se de que a água local ficasse sempre fresca. Alguns santuários foram construídos em torno de nascentes naturais, mas a maioria foi feita pelo homem.
— Então... Não existem ninfas vivendo atualmente aqui? — Piper perguntou esperançosamente.
— Não tenho certeza — disse Jason. — Este lugar onde estamos teria sido uma piscina com uma fonte. Muitas vezes, se o nymphaeum pertencia a um semideus, ele ou ela convidava as ninfas para viver lá. Se os espíritos fixassem residência, era considerado boa sorte.
— Para o proprietário — Percy adivinhou. — Mas também vincularia as ninfas à nova fonte de água, o que seria ótimo se a fonte estivesse em um parque agradavelmente ensolarado com água bombeada no meio da aquedutos...
— Mas este lugar está debaixo da terra há séculos — Piper adivinhou. — Seco e enterrado. O que aconteceu com as ninfas?
O som da água mudou para um coro de assobios, como cobras fantasmagóricas. A luz que ondulava mudou o tom de azul e verde mar para um limão e roxo doentio. Acima deles, os nove nichos brilhavam. Não estavam mais vazios.
De pé estava uma mulher velha e murcha, tão seca e frágil que lembrava a Piper um múmia, exceto que múmias normalmente não se moviam. Seus olhos eram de um tom roxo escuro, como se água azul clara de sua fonte de vida tivesse condensado e engrossado dentro deles. Seus finos vestidos de seda agora estavam esfarrapados e desbotados. Seu cabelo já tinha sido em cachos, combinado com joias ao estilo de romanos nobres, mas agora seus cabelos estavam desgrenhados e secos como palha. Se canibais aquáticos realmente existissem, Piper pensou, teriam essa aparência.
— O que aconteceu com as ninfas? — repetiu a criatura no nicho central.
Ela estava em situação ainda pior do que as outras. Sua costa estava curvada como o cabo de uma jarra. Suas mãos esqueléticas tinham apenas a mais fina camada de pele, semelhante a papel. Na cabeça, uma surrada coroa de louros de ouro brilhava em seu cabelo bagunçado.
Ela fixou os olhos roxos em Piper.
— Que pergunta interessante, minha querida. Talvez as ninfas ainda estejam aqui, sofrendo, esperando por vingança.
Da próxima vez que tivesse uma chance, Piper jurou que iria derreter Katoptris e iria vendê-la como sucata de metal. A faca estúpida nunca lhe mostrava toda a história. Claro, ela tinha visto a si mesma se afogando. Mas se soubesse que nove ninfas zumbis e dissecadas estariam esperando por ela, nunca teria vindo até aqui.
Ela considerou correr para as escadas, mas quando se virou, a porta tinha desaparecido. Naturalmente. Não havia nada lá a não ser uma parede branca. Piper suspeitou que não era apenas uma ilusão. Além disso, nunca chegaria ao lado oposto da sala antes que as ninfas zumbis saltassem sobre eles.
Jason e Percy se posicionaram em cada um dos lados dela, as espadas prontas. Piper estava contente por tê-los por perto, mas suspeitava suas armas não adiantariam nada. Ela tinha visto o que iria acontecer neste quarto. De alguma forma, essas coisas iriam derrotá-los.
— Quem são vocês? — Percy exigiu.
A ninfa do meio virou a cabeça.
— Ah... Nomes. Nós já tivemos nomes. Eu era Hagno, a primeira das nove!
Piper pensou que era uma piada cruel que uma bruxa como ela fosse nomeada Hagno, como a palavra em inglês para bruxa, mocreia, mas decidiu não comentar.
— As nove — Jason repetiu. — As ninfas deste santuário. Havia sempre nove nichos.
— É claro — Hagno mostrou os dentes em um sorriso cruel. — Mas somos as nove originais, Jason Grace, as que presenciaram o nascimento de seu pai.
A espada de Jason baixou.
— Você quer dizer Júpiter? Você estava lá quando ele nasceu?
— Zeus, como então era chamado — Hagno disse. — Era um bebê barulhento. Participamos do trabalho de parto de Reia. Quando o bebê nasceu, nós o escondemos de seu pai, Cronos, para que não o comesse. Ah, tinha pulmões fortes, este bebê! Fizemos tudo o que podíamos para abafar o barulho para Cronos não encontrá-lo. Quando Zeus cresceu, nos foi prometida honras eternas. Mas isso foi no velho país, na Grécia.
As outras ninfas choravam e arranharam seus nichos. Elas pareciam estar presas neles, Piper percebeu, como se seus pés estivessem grudados na pedra junto com as conchas decorativas.
— Quando Roma subiu ao poder, fomos convidadas para cá — disse Hagno. — Um filho de Júpiter nos tentou com favores. Uma nova casa, ele prometeu. Maior e melhor! Não há necessidade de pagamento, um excelente bairro. Roma vai durar para sempre.
— Para sempre — as outras assobiaram.
— Nós cedemos à tentação — disse Hagno. — Deixamos nossas simples nascentes e fontes no Monte Liceu e mudamos para cá. Durante séculos, nossas vidas foram maravilhosas! Festas, sacrifícios em nossa honra, vestidos e joias novas a cada semana. Todos os semideuses de Roma flertavam conosco e nos honravam.
As ninfas gemeram e suspiraram.
— Mas Roma não durou — Hagno rosnou. — Os aquedutos foram desviados. A vila de nosso mestre foi abandonada e destruída. Fomos esquecidas, enterradas sob a terra, mas não conseguimos sair. Nossas fontes de vida estão confinadas a este lugar. Nosso velho mestre nunca sentiu-se apto para nos libertar. Durante séculos, temos murchado aqui na escuridão, com sede... Muita sede — as outras arranhavam suas bocas.
Piper sentiu sua própria garganta fechando.
— Eu sinto muito por vocês — disse ela, tentando usar o charme. — Isso deve ter sido terrível. Mas nós não somos seus inimigos. Se nós pudermos ajudar...
— Oh, uma voz tão doce! — Hagno chorou. — Características tão bonitas. Eu já fui jovem como você. Minha voz era tão suave como um córrego de montanha. Mas você sabe o que acontece com a mente de uma ninfa quando ela está presa no escuro, sem nada para se alimentar, apenas o ódio, nada para beber, a não ser pensamentos violentos? Sim, minha cara. Você pode nos ajudar.
Percy levantou a mão.
— Uh... Eu sou um filho de Poseidon. Talvez eu possa convocar uma nova fonte de água.
— Há! — Hagno gritou e as outras oito repetiram: — Há! Há!
— De fato, filho de Poseidon — Hagno disse. — Eu conheço seu pai também. Efialtes e Oto prometeram que você viria.
Piper colocou a mão no braço de Jason para se equilibrar.
— Os gigantes — disse ela. — Você está trabalhando para eles?
— Eles são nossos vizinhos — Hagno sorriu. — As câmaras estão além deste lugar, onde o aqueduto de água foi desviada para os jogos. Assim que lidarmos com vocês... Quando você tiverem nos ajudado... Os gêmeos prometeram que nós nunca sofreremos de novo.
Hagno virou-se para Jason.
— Você, filho de Júpiter... pela horrível traição de seu antecessor que nos trouxe aqui, você deve pagar. Eu sei quais são os poderes do deus do céu. Eu o criei quando era um bebê! Antes, nós ninfas controlávamos a chuva acima de nossas fontes e nascentes. Quando eu lidar com você, teremos este poder novamente. E Percy Jackson, filho do deus do mar... De você tomaremos a água, uma fonte infinita de água.
— Infinita? — Os olhos de Percy vagaram de uma ninfa para a outra. — Uh... Olha, eu não sei sobre infinita. Mas talvez eu possa arranjar alguns litros.
— E você, Piper McLean — os olhos roxos Hagno brilharam. — Tão jovem, tão linda, tão talentosa com sua voz doce. De você, vamos recuperar nossa beleza. Nós conservamos a nossa força de vida para este dia. Estamos com muita sede. De vocês três, vamos beber!
Todos os nove nichos brilharam. As ninfas desapareceram e água jorrou de suas alcovas, água de um escuro doentio, como o petróleo.

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